Título: Brasil deu o segundo grito de liberdade, diz Lula
Autor: Werneck, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/02/2008, Economia, p. B5
Em discurso na inauguração de fábrica, presidente comemora notícia de que o País deixou de ser devedor
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem da inauguração da nova fábrica de pneus da Michelin, no Rio, o palco para um discurso-desagravo contra o Fundo Monetário Internacional (FMI), no qual houve críticas até para uma das principais instituições financeiras americanas, o Citibank. Cinco dias após o anúncio, pelo Banco Central, da mudança de posição do Brasil de devedor para credor internacional, Lula disse ter preparado o País para 'dar o segundo grito de liberdade'.
'Não precisava gritar Independência ou Morte, era só gritar respeito, dignidade. Em 2005, dissemos ao FMI: não precisamos de vocês mais aqui, peguem os US$ 15,9 bilhões, tchau e bênção, que nós vamos cuidar do nosso próprio nariz, com nossos erros e acertos', afirmou Lula. A platéia, composta por cerca de 200 funcionários e convidados, irrompeu em aplausos.
Fazendo referência a fatos históricos, como a Inconfidência Mineira e a Independência, de 1822, Lula referiu-se ao FMI - ao qual o Brasil recorreu pela última vez em 2002 - como uma espécie de controlador do País. 'Era preciso vir alguém aqui para dizer: só pode comer aquilo, só pode fazer aquilo', reclamou, dizendo que o Fundo depositara o dinheiro na conta brasileira e manteve 'uma espada na cabeça do governo'.
Antes do discurso, Lula percorreu a fábrica, especializada em pneus para equipamentos de mineração, com o presidente da Michelin na América do Sul, Luiz Fernando Beraldi, e do governador do Rio, Sérgio Cabral, num clima de camaradagem. A fábrica da companhia francesa, um investimento de US$ 200 milhões, tem capacidade para produzir 40 mil toneladas de pneus por ano e vai criar 200 empregos diretos.
Já no palco, dois funcionários fizeram um agradecimento ao presidente, que os abraçou e lembrou que viveu um terço de seus 62 anos dentro de fábricas. Dizendo ter sofrido resistências e preconceito pela origem operária, ele afirmou aos funcionários da Michelin que o seu papel é 'vender auto-estima'.
A valorização pessoal foi o mote de sua classificação da mudança de posição do País, em janeiro, no conceito financeiro internacional. 'Significa que hoje, com muita humildade, nós poderemos transitar no mundo, não com o nariz em pé, mas de cabeça erguida, dizendo: nós não queremos ser maiores ou menores que ninguém, nós queremos apenas ser respeitados enquanto Nação e ser respeitados na nossa soberania.'
Com ironia, Lula voltou-se também para o cenário econômico interno: 'Se vocês pegarem os analistas econômicos, vão perceber que todos quebraram a cara', declarou. E voltou a defender a blindagem do País à crise do subprime nos Estados Unidos, novamente classificada por ele como resultado de operações do sistema financeiro americano que 'resolveu ganhar dinheiro fácil'.
Para o Citibank sobraram revelações de uma ligação iniciada antes de sua gestão na Presidência. 'Quantas vezes o Citibank veio ao Brasil, em reuniões comigo, eu não era nem presidente ainda', disse, lembrando que executivos da instituição tentaram nortear a política econômica brasileira. 'Como o Citibank sabia o que era bom, o que era ruim, dizia tudo que a gente tinha que fazer. Tomou na cara em US$ 10 bilhões', ironizou.
'Essa crise que tem um nome bonito, subprime, até agora não chegou até aqui. Nós temos solidez porque fizemos como a formiguinha: enquanto alguns cantarolavam, ficamos comprando dólar e hoje temos US$ 190 bilhões de reservas para enfrentar essas e outras crises.'
Lula citou declaração de 2003, de que não poderia errar no governo. 'Eu dizia: todo mundo tem condições de errar, o Lula não pode. Já tinha um preconceito enorme contra mim, um torneiro-mecânico, sem diploma universitário, ganhar a presidência, já era uma coisa que muita gente não suportava, era demais. O cara sair de Garanhuns para não morrer de fome e virar presidente?', disse.
FRASES
Luiz Inácio Lula da Silva Presidente
'Em 2005, dissemos ao FMI: não precisamos de vocês, peguem os US$ 15,9 bi, tchau e bênção'
'Se vocês pegarem os analistas econômicos, vão perceber que todos eles quebraram a cara'
'Fizemos como a formiguinha: enquanto alguns cantarolavam, ficamos comprando dólar'
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