Título: Superávit declinante
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2008, Notas e Informações, p. A3
Diversos fatores contribuíram para o mau desempenho da balança comercial nos dois primeiros meses de 2008, quando o superávit acumulado, de US$ 1,8 bilhão, foi 66,67% menor do que o de igual período de 2007. Como alguns desses fatores são sazonais, não se pode projetar o resultado do bimestre para todo o ano. Ou seja, o saldo comercial de 2008 não será necessariamente apenas um terço do superávit de 2007, como foi no primeiro bimestre.
Mas não há dúvida de que a balança comercial passa por mudanças que podem levar até ao ressurgimento de déficits setoriais. E essa não é uma hipótese tão remota, como se pode concluir do exame de um estudo recente da Funcex, no qual, além dos valores das exportações e das importações, se comparam também as quantidades transacionadas. A comparação das quantidades mostra a paulatina perda de dinamismo das exportações e o extraordinário crescimento das importações, sobretudo de bens de consumo duráveis.
Do lado das exportações, os resultados do primeiro bimestre não devem se repetir porque, entre outros fatores, a escassez de carne no mercado mundial deve manter o preço do produto em alta. Essa alta beneficiará nossas vendas externas e deverá compensar as restrições impostas pela União Européia ao produto brasileiro. Os reajustes do minério de ferro, de sua parte, devem acrescentar cerca de US$ 4 bilhões às exportações brasileiras. Não parece improvável, por isso, que o total das exportações neste ano alcance os US$ 180 bilhões previstos pelo governo, ou até supere esse valor, como já projetam algumas instituições privadas.
Quanto às importações, o crescimento observado em janeiro e fevereiro se deveu, segundo o secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, ao aumento das compras de trigo, automóveis, gás natural e máquinas e equipamentos, além da alta do petróleo.
Nos últimos meses, o resultado das exportações foi favorecido pela alta dos preços de alguns itens de nossa pauta. Mas o aumento do valor das exportações tem sido bem menor do que o aumento do valor das importações. Enquanto o valor das vendas cresceu de 15% a 17% no total acumulado de 12 meses, o das importações cresceu mais de 33%.
Quando se considera a quantidade transacionada, a diferença do desempenho das exportações e das importações é muito maior. O estudo da Funcex mostra que, nos 12 meses acumulados até janeiro, as exportações cresceram 5% em relação aos 12 meses anteriores, enquanto as importações aumentaram 22,1%, ou seja, mais de quatro vezes.
As importações que mais cresceram foram as de bens de consumo duráveis (56,9%) e as de bens de capital (34,1%). Esses dados demonstram o forte aquecimento da demanda interna e a disposição do setor produtivo de expandir sua capacidade.
Um ponto que não fica evidente no estudo da Funcex, mas que afeta os resultados da balança comercial e pode ser constatado nos registros da Secretaria de Comércio Exterior, é que grandes empresas estão aumentando mais suas importações do que suas exportações. Elas compram mais componentes, insumos e matérias-primas no exterior, cujos preços ficaram competitivos por causa da valorização do real, e vendem mais para o mercado interno, porque a lucratividade das exportações diminuiu e também por causa da valorização da moeda brasileira.
O ritmo da economia brasileira, bem como o real fortalecido em relação ao dólar, deverá manter aquecidas as importações, especialmente as de bens de consumo duráveis e de bens de capital. Mas também as compras de bens intermediários, componentes e matérias-primas continuarão a crescer em ritmo intenso.
Do lado das exportações, o cenário é outro. A demanda interna forte e a perda de competitividade do produto brasileiro em decorrência do dólar barato tendem a reduzir mais o crescimento das vendas externas. Se o País dispusesse de melhores condições para exportar - infra-estrutura de transportes terrestres adequada, portos mais eficientes e baratos e menos burocracia - as exportações seriam menos afetadas.