Título: Sob pressão, STF julga pesquisas com embriões
Autor: Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/03/2008, Vida&, p. A38

Pacientes fazem manifestação em Brasília; CNBB ataca liberação do uso de células-tronco embrionárias e ministro defende Lei de Biossegurança

Um grupo de 30 pessoas, entre portadores de doenças degenerativas e seus familiares, realizou ontem diante do Supremo Tribunal Federal (STF) um ato em favor da Lei de Biossegurança, cuja legalidade será analisada na próxima semana pela mais alta corte do País. No grupo estava Daniele Araújo, casada com Ronald de Carvalho, de 34 anos, que sofre de esclerose múltipla. Em 2005, quando a lei foi aprovada pelo Congresso, Carvalho conseguia andar de muletas e tinha autonomia para atividades básicas. Hoje, precisa de ajuda para praticamente tudo, conta Daniele. Ela era católica. Quando o marido começou a desenvolver a doença, depositou suas esperanças nas pesquisas com células-tronco embrionárias. Diante da resistência da Igreja, conta, ela perdeu a fé no catolicismo. ¿Hoje eu sou espírita¿, revelou.

O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), d. Dimas Lara Barbosa, disse ontem que a campanha feita pela Igreja contra o uso de células-tronco embrionárias tem um objetivo maior: evitar precedentes para liberação do aborto. ¿Isso poderia abrir caminho. Tudo começa nesta primeira transigência¿, afirmou. A CNBB deverá encaminhar na próxima semana a cada um dos ministros do STF um apelo para que julguem procedente a ação direta de inconstitucionalidade (Adin)contra a Lei de Biossegurança e assim proíbam o uso dos embriões em pesquisas.

A Lei de Biossegurança permite o uso de células-tronco de embriões que estão em clínicas de fertilização, desde que uma série de exigências sejam atendidas. Além de autorização expressa dos pais biológicos, tais embriões têm de estar congelados já há alguns anos, o que os torna inviáveis para a implantação no útero. Para d. Dimas, os embriões devem permanecer congelados - ele se declarou contrário ao congelamento de embriões, mas afirmou que a CNBB ainda não tem posição definida sobre o tema.

Para o presidente da CNBB, d. Geraldo Lyrio Rocha, parte dos pesquisadores manipula os sentimentos dos pacientes e de seus familiares. ¿A Igreja não é insensível ao sofrimento de tantas pessoas, mas somos contrários às falsas expectativas. Eles (os pesquisadores) dão uma falsa esperança de cura. É uma atitude reprovável, um desserviço¿, completou.

`ERA DO ATRASO¿

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse ser completamente favorável a pesquisas com células-tronco.

¿Estamos apreensivos com o julgamento no dia 5. Somos completamente favoráveis às pesquisas com células-tronco, principalmente porque é um assunto científico em que o Brasil está em pé de igualdade com os países desenvolvidos¿, disse Temporão, após visitar o Hospital da Lagoa, zona sul do Rio.

Segundo ele, ¿a decisão do STF dirá se o País quer continuar numa era de ¿obscurantismo e atraso ou seguir no fortalecimento da capacidade científica brasileira¿. Temporão disse não temer entrar em conflito mais uma vez com a Igreja Católica. ¿Essa não é uma questão religiosa. Tem a ver com conhecimento, ciência e o desenvolvimento do Brasil.¿

Segundo ele, o Ministério da Saúde investiu recentemente R$ 15 milhões em terapia celular com células-tronco adultas para o tratamento de doenças cardiovasculares. O estudo é desenvolvido por pesquisadores da Universidade de São Paulo, do Instituto Nacional de Cardiologia e da Universidade Federal do Rio de Janeiro.