Título: Legislativo custa mais do que deveria
Autor: Manzano Filho, Gabriel
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/03/2008, Nacional, p. A5
Marcus Figueiredo: cientista político e diretor do Iuperj. Distorção nos gastos das Casas, para Figueiredo, é o resultado de maus costumes, como o de decidir o próprio salário
Os altos custos do Legislativo brasileiro e o fato de algumas Assembléias estaduais gastarem até mais que a Câmara dos Deputados - como mostrou ontem reportagem publicada pelo Estado - são o resultado de maus hábitos políticos, ¿e o primeiro deles é que os parlamentares podem decretar seus próprios salários¿, diz o cientista político Marcus Figueiredo, diretor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj).
O levantamento, feito pela ONG Transparência Brasil, apontou, por exemplo, que a Câmara Legislativa do Distrito Federal prevê gastar em 2008 cerca de R$ 11,8 milhões por deputado. Já a Assembléia do Rio estima despesa de R$ 7,2 milhões, enquanto o gasto previsto pela Câmara dos Deputados é de R$ 6,9 milhões. Ao avaliar os números, Figueiredo comparou: ¿Não fazem sentido. Até porque o Congresso faz gastos importantes em atividades de apoio, como computação, bibliotecas e outros.¿ A seguir, a entrevista:
O que significam os resultados dessa pesquisa?
É preciso primeiro definir de que atividades e despesas estamos falando. É lícito que os parlamentares contem com apoio para bem exercer suas atividades. Há muitos serviços que garantem benefícios importantes. A Câmara, por exemplo, tem uma área de computação e apoio de excelente qualidade, o Senado tem o Prodasen, há bibliotecas e, às vezes, bons programas culturais nas TVs das duas Casas. Mas isso não desmente o fato de que o Legislativo brasileiro, se não é o mais caro do mundo, custa muito mais do que seria lícito a população pagar.
Por que isso acontece?
Porque o gasto de recursos públicos, no Brasil, é muito fácil. A começar pelo direito que se dão, os nossos parlamentares, de decidir seus próprios vencimentos. Além disso, há um evidente excesso de despesas pessoais ressarcidas pelo Poder Legislativo, que não sofrem qualquer controle - com hospedagem, viagens, assessores de todo tipo.
E por que as Assembléias gastam mais que a Câmara?
Isso não faz sentido. Em princípio, não há como explicar que Assembléias do Rio, Minas ou outras custem mais que a Câmara. Mas esses gastos devem ser analisados com atenção. Sei de muitas atividades úteis, que acontecem por exemplo na Assembléia de Minas, que tem até um curso de gestão pública de alta qualidade. Claro, isso não justifica os abusos. Outros estudos já apontaram, antes, algo parecido: que há uma relação claramente antidemocrática entre o rendimento per capita dos deputados e o da população.
Como é esse controle nos outros países?
É muito mais transparente. O total a ser gasto com pessoal, pelo Poder Legislativo, é objeto de longos debates. Após aprovado, é seguido à risca. Se for demais, a mídia e as associações da comunidade caem em cima. É difícil um político local escapar dessa cobrança.
O caminho aqui seria esse?
Sim, mas também devemos admitir que esse tipo de controle, em nosso País, vem melhorando, com serviços de TV dos Legislativos, com sites especializados na internet. E também cabe lembrar que não adianta cobrar só do Legislativo. Esse problema é muito maior no Executivo. Você não assiste pela TV ministros e seus assessores discutindo como gastar esta ou aquela verba.
Quem é: Marcus Figueiredo
Doutor em Ciência Política pela USP. Diretor de Pesquisas do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj)
PhD pela Universidade de Chicago
É autor dos livros A Decisão do Voto: Democracia e Racionalidade e Política de Coerção no Sistema Político Brasileiro