Título: Governo muda foco do ataque à pirataria
Autor: Sobral, Isabel
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/08/2008, Economia, p. B6
Estratégia é deixar de associar compra de produtos ao crime
Isabel Sobral, BRASÍLIA
Uma fatia de 75% da população brasileira admite consumir algum tipo de produto falsificado. Essa grande maioria, espalhada por todas as classes sociais, reconhece o mal que isso causa ao País, mas não se sente responsável porque não vê o seu "pequeno" ato contribuindo para um crime.
Essas são as principais conclusões de um estudo organizado pelo Instituto Akatu, em parceria com a empresa Microsoft, sobre o comportamento do consumidor brasileiro em relação à pirataria no País. O levantamento foi entregue ontem ao Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP), vinculado ao Ministério da Justiça, que o usará como subsídio às ações de combate à pirataria.
O Instituto Akatu organizou o levantamento aproveitando pesquisas anteriores realizadas, entre 2005 e 2007, na cidade de São Paulo e cruzou com percepções colhidas em grupos de consumidores convidados a debater o assunto. "O trabalho foi feito em São Paulo, mas pode retratar qualquer cidade do País", disse a pesquisadora Marta Capacla, uma das coordenadoras do estudo.
Com base nas conclusões, o presidente do CNCP e secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, anunciou mudanças nas próximas ações de combate à venda de produtos piratas que serão patrocinadas pelo conselho. O foco das campanhas publicitárias, por exemplo, deverá ser a primeira alteração, pois fará menos vinculação entre pirataria e crime organizado e será mais voltado à questão ética.
"A reação das pessoas mostra que campanhas que destaquem apenas a ligação com o crime não funcionam, temos que dar um passo no sentido da educação", afirmou Barreto.
Na parte qualitativa da pesquisa, as pessoas ouvidas responsabilizaram o "governo" e os "fabricantes" pelos altos preços dos produtos originais desejados, o que as leva ao consumo das versões falsificadas, mais baratas.
Outra orientação do estudo é a mudança de abordagem como, por exemplo, o uso do termo pirataria. "A palavra teria algo de sedutor às pessoas e, particularmente, aos jovens", comentou Marta Capacla, citando o apelo publicitário e cinematográfico da imagem do pirata criado em filmes recentes.
Para a pesquisadora, pode ser mais útil no sentido de convencer as pessoas associar este tipo de mercadoria aos termos "falsificado" ou "ilegal". O secretário-executivo anunciou a criação, ainda este ano, de um portal de combate aos produtos falsificados na internet, que deverá ter a participação do governo e da iniciativa privada.
As análises por faixa etária das pessoas que reconheceram consumir pirataria mostram aumento porcentual dos consumidores com idades entre 15 e 40 anos, mas também uma "leve alta" entre as pessoas com mais de 60 anos. O produto mais falsificado, com 53% da preferência, é o DVD.
Segundo balanço apresentado pelo conselho, os resultados das ações de fiscalização e combate à pirataria revelam crescimento nas operações de repressão, mas também sugerem um aumento do consumo de mercadorias falsificadas.
Em 2007, foram instaurados 8,7 mil inquéritos pela Polícia Federal para investigar comércio ilegal. Somente no primeiro semestre deste ano, o número já chega a 6,3 mil. Pelos dados da Receita, os valores dos produtos apreendidos em operações em 2007 totalizaram R$ 1,051 bilhão. Em 2006, esse valor foi de R$ 871,7 milhões.