Título: Para economistas, trajetória do juro não muda
Autor: Froufe, Célia
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/08/2008, Economia, p. B10
Demanda continua aquecida, e não há perspectiva para mudança da Selic na próxima reunião
Jacqueline Farid, RIO
Debruçados sobre o conteúdo da última ata do Comitê de Política Monetária (Copom), economistas avaliam que não há novidades suficientes nos destaques do documento que justifiquem uma mudança de perspectiva para a trajetória da Selic nos próximos meses. Há divergências em relação aos rumos apontados pelos reajustes de preços, mas unanimidade na constatação de que a demanda permanece muito aquecida.
A pedido do Estado, o ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC e economista-chefe do Santander, Alexandre Schwartsman; o economista da PUC-RJ, Luiz Roberto Cunha, e o ex-diretor de Política Monetária do BC e o chefe do departamento de economia da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, avaliaram alguns dos principais trechos da ata da reunião do Copom de junho e apontaram a evolução, desde então, dos argumentos listados para elevação de 0,75 ponto na Selic. O Comitê se reúne novamente em 9 e 10 de setembro.
Um dos pontos avaliados é a afirmação, na ata, que "os dados referentes à atividade econômica indicam que o ritmo de expansão da demanda doméstica continua bastante robusto e responde, ao menos parcialmente, pelas pressões inflacionárias que têm sido observadas no curto prazo, a despeito do forte crescimento das importações e do comportamento benigno do investimento".
Para Schwarstsman, não houve nenhuma mudança na situação diagnosticada pelo Comitê. Ele sublinha que os dados referentes à demanda continuaram robustos, o varejo se acelerou entre maio e junho e as indicações são de continuidade desse processo em julho e agosto.
Além disso, de acordo com o economista, não há indicação de recuo em utilização de capacidade, e sim "uma modesta elevação, que eu veria mais como estabilidade, mas refresco não houve".
Cunha concorda e ressalta que "de certa forma a pressão está até maior, vide os dados do varejo e da indústria". Porém, ainda sobre o mesmo trecho da ata, Thadeu de Freitas avalia que a demanda permanece elevada, mas destaca que "não houve um aumento adicional, mas sim sinal de estabilidade ou desaceleração na margem" desde a divulgação do documento do Copom. "Pelo menos neste caso, os motivos da preocupação diminuíram."
Outra observação da ata avaliada pelos economistas diz respeito à conjuntura externa. Diz o Copom: "Em linhas gerais, a influência do cenário externo sobre a trajetória prospectiva da inflação brasileira continua sujeita a efeitos contraditórios e envolta em considerável incerteza". Para Thadeu de Freitas, também nesse caso as preocupações diminuíram, já que há recuo no ritmo de alta dos índices inflacionários e mais clareza de desaceleração mundial.
Mas, para Cunha e Schwarstman, os motivos para cautela, nesse caso, ainda são muitos. O economista da PUC-RJ acredita que as incertezas aumentaram ainda mais nas últimas semanas, por causa da volatilidade nos preços do petróleo e de outras commodities. "Não temos mais o viés de alta, mas a incerteza permanece muito elevada", disse.
Para o economista-chefe do Santander, ainda que os "efeitos contraditórios" tenham mudado de sinal, eles permanecem contraditórios. O argumento é que, enquanto os preços de commodities subiam, aceleravam a inflação, mas, simultaneamente, valorizavam o real, o que tende a reduzir as taxas inflacionárias. "Agora os preços caem, mas a moeda se desvaloriza, permanecendo (sem surpresa) a mesma oposição", observa.
Para Schwartsman, "ainda que o cenário externo definitivamente não seja maligno, também continua sem dar sinais de que poderia contribuir para redução da inflação".
FRASE
Alexandre Schwartsman Ex-diretor do BC e economista-chefe do Santander
"Ainda que o cenário externo definitivamente não seja maligno, também continua sem dar sinais de que poderia contribuir para redução da inflação"