Título: Fotos revelam falhas e fios expostos
Autor: Brancatelli, Rodrigo
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/08/2008, Metrópole, p. C3

Imagens feitas para uma tese da FAU mostram infiltrações, vazamentos e falta de saída de emergência

Rodrigo Brancatelli

Apesar de o Corpo de Bombeiros atestar há menos de um mês que o Teatro Cultura Artística apresentava condições de segurança para abrigar peças e concertos, o mesmo espaço que recebeu elogios não conseguiu passar por uma análise mais detalhada de um arquiteto do curso de especialização da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). Em sua tese sobre o Cultura Artística, apresentada em julho deste ano, ele encontrou e documentou falhas como fios expostos no palco, ferrugem, infiltrações, vazamentos, falta de saídas de emergência, concreto desgastado e muita madeira deteriorada.

A tese de Anderson Leite Schmidt, de 28 anos, realizada com supervisão do professor de Tecnologia da Construção e Projeto João Roberto Leme Simões, foi aprovada com nota 9,2. De maio a julho deste ano, o arquiteto visitou o Teatro Cultura Artística para escrever sobre ¿Patologias, Origens e Reflexos no Desempenho Técnico-Construtivo do Edifício¿. Ao fazer suas análises, utilizou como base os métodos dos bombeiros e da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), principalmente a norma NBR 6241, que trata sobre materiais isolantes e coberturas protetoras. E achou uma série de inadequações do projeto, problemas de execução de obras, materiais empregados e manutenção - que podem ou não estar relacionadas de alguma forma com o incêndio no domingo, mas que fazem um retrato do estado de conservação de um dos espaços culturais mais importantes da cidade.

As falhas foram documentadas em cerca de 200 fotos. Entre as possivelmente mais graves, o arquiteto encontrou a marquise da fachada sem impermeabilização, estrutura da escada de incêndio corroída pela ferrugem, corrimãos com altura e formato incorretos, laje com infiltração e pisos com madeira deteriorada. A rede elétrica do Cultura Artística não é embutida nas paredes, como o recomendado em qualquer construção - muitos fios permaneciam expostos no palco. A caixa de disjuntores tinha ferrugem nas soldas. Já tubulações de água ficam em paralelo aos conduítes da rede elétrica, o que poderia causar um acidente em caso de vazamento.

¿Isso é algo sério, perigoso, possivelmente causado porque o projeto é antigo e deve ter havido várias alterações durante as décadas¿, diz a professora Rosario Ono, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, especialista em segurança contra incêndios. ¿Isso não significa que tenha causado um incêndio, longe disso, pois um incêndio é uma soma de erros. Mas retrata uma falha.¿

ERROS NA SEGURANÇA

Se o incêndio de domingo tivesse ocorrido durante uma apresentação, a ocorrência poderia ter tomados proporções trágicas. Segundo o estudo de Schmidt, as portas de saída de emergência, do corredor de acesso ao auditório, de madeira, abriam para dentro, quando a norma dos bombeiros é que seja para fora. Na Sala Rubens Sverner, o teatro menor, com 339 lugares, nem sequer existia saída de incêndio. Já as portas de saída de emergência da platéia da Sala Esther de Mesquita, com 1.156 poltronas, onde teria começado o fogo, tinham dimensões menores que o recomendado - cerca de 80 centímetros de largura, quando o normal seria de 1,20 metro.

¿Algumas normas não foram seguidas, isso é fato¿, diz Schmidt. O arquiteto queria mesmo era analisar as condição de construção e manutenção dos museus paulistas. Mas como não recebeu a autorização de alguns diretores, acabou escolhendo o Cultura Artística como assunto para a sua tese de especialização da FAU-USP por gostar do teatro. ¿Sempre ia lá, achei que seria interessante analisar a estrutura para a minha pós-graduação em patologias construtivas. Por ser um projeto antigo, acabei encontrando vários problemas de execução e de manutenção, algumas coisas que poderiam sim causar um acidente. No final até ofereci para a direção do teatro se queriam uma cópia, mas ninguém mostrou interesse.¿

OS PROBLEMAS

Falta de drenagem no piso, que está impermeabilizado

Umidade na parte externa

Marquise da fachada sem impermeabilização

Estrutura da escada de incêndio corroída de ferrugem

Corrimãos com altura e formato incorretos

Estrutura de acesso ao ar-condicionado e telhado sem corredores projetados para circulação e manutenção

Madeiramento da cobertura com início de deterioração

Laje com infiltração

Vazamento no encontro das telhas com a parede

Esquadrias fixas de ferro com deterioração pela ferrugem

Porta de emergência, do corredor de acesso ao auditório, de madeira, abre para dentro

Não existe saída de incêndio para a Sala Rubens Sverner

Portas de saída de emergência da platéia com dimensões menores do que os técnicos exigem

Corredores entre as poltronas estreitos para passagem em caso de emergência

Piso do urdimento (armação construída ao longo do teto do palco, para permitir o funcionamento de dispositivos cênicos), bem como os pisos de acesso à cobertura e à caixa acústica, de madeira, já estão deteriorados

Toda a rede elétrica do prédio não é embutida nas paredes. Alguns fios passam pelos forros de gesso, por exemplo na área da platéia

Caixa de disjuntores com ferrugem nas soldas

Condutores de águas pluviais deteriorados, causando infiltrações nas paredes

Tubulações de água fria em paralelo a conduítes