Título: Estudo revela destino do dinheiro do petróleo
Autor: Otta, Lu Aiko
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/08/2008, Economia, p. B3
Universidade avaliou 30 cidades brasileiras que recebem royalties e mostrou que, em 2005, a que mais lucra só investiu 15,4% das receitas
Lu Aiko Otta
A riqueza derivada do petróleo não é preferencialmente usada em investimentos, como seria o ideal. Estudo elaborado por professores da Universidade Cândido Mendes (Ucam) mostra que os municípios que mais recebem receitas com petróleo investem só uma parte do dinheiro. Das 30 prefeituras analisadas, apenas sete aplicam em investimento mais do que recebem em royalties e participação especial.
A cidade que mais lucra com a exploração petrolífera no País é Campos dos Goytacazes (RJ). Em 2005, mostra o estudo, recebeu R$ 607 milhões em receitas do petróleo, mas investiu apenas R$ 93,6 milhões, o equivalente a 15,4%. O caso mais grave detectado pelos pesquisadores foi a cidade de Silva Jardim (RJ), que recebeu R$ 12,4 milhões e investiu R$ 1,2 milhão, ou 9,7%. Ilhabela (SP) teve os cofres engordados em R$ 16 milhões por causa do petróleo, mas investiu só R$ 5 milhões (31,25%). Na outra ponta, o município do Rio de Janeiro recebeu R$ 45 milhões e somou investimentos de R$ 557 milhões.
¿Grande parte dos recursos do petróleo não é gasta com investimentos¿, afirma o professor Rodrigo Serra, da Ucam. Para ele, o melhor exemplo de bom uso do dinheiro do petróleo é a cidade de Aberdeen, na Escócia. Lá, parte das receitas geradas pelo petróleo foi usada para transformar a cidade em um grande centro tecnológico. ¿Quando o petróleo acabar, eles vão exportar know-how em petróleo¿, disse.
No Brasil, avalia, o dinheiro poderia ser direcionado para pesquisas na área de bioenergia. Os municípios, por sua vez, poderiam utilizar o dinheiro para preservar áreas de manancial e para apoiar a pesca artesanal - a atividade econômica mais prejudicada com a exploração do petróleo.
Em vez de investir, as prefeituras estão usando o dinheiro do petróleo para contratar mais funcionários, segundo mostra outro levantamento, também elaborado na Ucam, noticiado pelo Estado em abril. O estudo revela que o número de funcionários na prefeitura de Campos dos Goytacazes saltou de 7.495 para 22.979 entre 2002 e 2006, sem contar os terceirizados. Os gastos com folha salarial somam R$ 487 milhões por ano, valor sete vezes maior que a arrecadação do município sem contar as receitas de petróleo. O quadro se repete em outras cidades.
¿Os gastos das prefeituras com pessoal, repasses para organizações não-governamentais e outros subsídios são alarmantes¿, disse o professor Rodrigo Serra.
Ele explica que parte dos royalties não pode, por lei, ser gasta com funcionalismo. Mas outra parte é gasta livremente por União, Estados e municípios. ¿A lei está frouxa¿, afirmou.
Nesse sentido, a iniciativa do governo de criar uma regra determinando como o dinheiro do petróleo do pré-sal será gasto está na direção correta, avalia o professor. Ele acha, porém, que a discussão está muito restrita diante de sua importância.
¿Fico aflito porque a discussão está muito focada na arrecadação, sem incluir a vinculação dos recursos¿, disse. ¿Parece um debate acadêmico, quando, na verdade, é uma questão que interessa a toda a sociedade e deveria ser alvo de audiências públicas, plebiscitos.¿
Ele defende que o dinheiro do petróleo não vá diretamente para os cofres públicos, como ocorre hoje. Uma vez no caixa, o dinheiro é misturado com outras receitas, como a arrecadação de tributos, e o cidadão não tem como saber o que foi feito, exatamente, com os recursos petrolíferos. A fiscalização ficaria mais fácil, disse, se o dinheiro fosse para um fundo específico.