Título: Desequilíbrio marca estrutura de embaixadas
Autor: Marin, Denise Chrispim
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2008, Nacional, p. A16
Itamaraty mantém 27 diplomatas na Argentina, enquanto destina 11 para China e Japão
Denise Chrispim Marin, Brasília
Nos anos 60, diante da embaixada em Paris, um brasileiro indignado perguntou ao porteiro, um senhor português, por que naquela hora da tarde o diplomata Vinícius de Moraes ainda não estava no trabalho. O português respondeu, prontamente: ¿De dia, ele não está; de noite é que ele não vem.¿ Repetida com uma pitada de carinho ao poeta boêmio, exonerado do Itamaraty pelo governo militar em 1969 e reabilitado apenas em 2006, a história ilustra um dos estereótipos mais fortes da diplomacia no serviço público federal: a do funcionário ilustrado que resiste em pegar no pesado.
Na prática, o Itamaraty não foge da prática corrente das repartições públicas, onde para cada profissional que se dá o direito de negligenciar suas tarefas há outro que trabalha dobrado. Nos últimos cinco anos, uma das apostas do comando do Itamaraty foi a alocação de mais diplomatas para os postos mais importantes do Brasil no exterior.
As duas embaixadas mais densamente ocupadas são as de Washington, com 28 diplomatas, e de Buenos Aires, com 27. Em ambas, há diplomatas que batem cabeça em uma mesma atividade e outros que passam o dia sem fazer nada ou pouco mais que isso. Mas há também os que, visivelmente, levam adiante projetos e análises em regime intensivo.
No Itamaraty, uma queixa clássica repetida pelos embaixadores no exterior diz respeito à falta de pessoal. Parte dessas reclamações foi atendida. Na missão do Brasil em Genebra, até o fim dos anos 90, não era incomum observar um mesmo diplomata preparar um relatório de extrema importância, tirar cópias do documento e sair correndo para representar o Brasil em uma sessão de trabalho na Organização Mundial do Comércio (OMC). Hoje, a estrutura, que será desmembrada em duas, desobriga o diplomata a exercer funções que não são suas. Por enquanto, a missão abriga 23 diplomatas.
Apesar das mudanças já realizadas, há regiões e países que vêm perdendo ênfase nas relações bilaterais. A embaixada em Paris conta com 14 diplomatas registrados - um a mais que em Berlim e em Londres. A missão do Brasil junto à União Européia, em Bruxelas, mantém dez diplomatas. Entretanto, na mais dinâmica economia do mundo, a China, o Itamaraty mantém 11 diplomatas - mesmo número verificado na embaixada em Tóquio. Em outro país emergente que se destaca pelo crescimento econômico, a Índia, há apenas oito diplomatas. Na missão junto à Organização das Nações Unidas (ONU) são 21 diplomatas - ali há a expectativa de início das negociações sobre a reforma do Conselho de Segurança.
INCENTIVO
Nos últimos anos, com o eixo da política externa voltado para o mundo em desenvolvimento e com a abertura de novos postos na África, o Itamaraty enfrentou um novo desafio - como preenchê-los com diplomatas.
Uma mudança nas condições para a promoção na carreira ajudou nesse processo. O tempo de permanência em um posto ¿D¿, categoria dos países mais pobres e/ou que oferecem as piores condições de vida, é multiplicado por três nos cálculos da promoção. O Itamaraty também passou a oferecer esses postos a terceiros secretários, os diplomatas iniciantes, por períodos transitórios de um ano. Como a maioria conta apenas com um embaixador - em geral, um ministro de segunda classe na carreira - e um outro diplomata iniciante, não é raro o novato substituir seu chefe, como encarregado de negócios