Título: Litoral é menos eficiente nos gastos
Autor: Cafardo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/08/2008, Vida, p. A26
Estudo inédito traça as regiões no Estado de SP que aplicam melhor a verba e obtêm mais qualidade no ensino
Renata Cafardo
Estudo inédito de pesquisadores da Fundação Getulio Vargas (FGV) aponta a Baixada Santista como a menos eficiente na aplicação dos recursos em educação entre 15 regiões do Estado de São Paulo. Na outra ponta, a região que melhor aplica o dinheiro destinado ao ensino público municipal é a de Barretos, conhecida pelas festas de peão.
Obtido com exclusividade pelo Estado, o estudo da FGV traçou pela primeira vez um mapa da eficiência dos gastos com educação no Estado de São Paulo. O ineditismo é o fato de ele cruzar as notas dos estudantes em provas oficiais com o recurso investido na educação da cidade. ¿Os municípios mais eficientes são os que têm melhores resultados com menos dinheiro. É uma questão de gestão¿, explica o professor da FGV Paulo Arvate, um dos coordenadores do trabalho.
O pesquisador afirma que os resultados devem ser analisados de maneira relativa, ou seja, a eficiência de um município é expressada por um índice produzido com base nos resultados de todas as cidades. Os rankings mostram as regiões de acordo com a eficiência na aplicação dos recursos, ou seja, investimentos que se traduzem em qualidade.
Na Baixada Santista, por exemplo, 32,6% dos recursos acabam desperdiçados. Na Grande São Paulo, a quinta pior região, o índice é de 26,5%. Isso equivale à quantidade de recursos a menos que a região poderia ter usado e, mesmo assim, atingir o mesmo desempenho das mais eficientes (mais informações acima).
O estudo considerou como indicador de aprendizagem dos alunos o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), criado há dois anos pelo Ministério da Educação e que se tornou referência para indicar a qualidade das escolas públicas brasileiras.
O Ideb é formado pela nota dos alunos na Prova Brasil - que avalia todos os estudantes de redes públicas de 4ª e 8ª séries em português e matemática - e o índice de aprovação. Foi com o Ideb que a FGV cruzou as verbas investidas na educação municipal. ¿O prefeito agora não pode apenas dizer: meu Ideb é bom. É preciso ver se há municípios que conseguiram o mesmo e estão gastando menos¿, diz outra coordenadora do estudo e professora do departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Fabiana Rocha. O levantamento da FGV, a partir de agora, será feito todos os anos.
A região de São José do Rio Preto, que agrega 94 municípios no noroeste paulista, teve o maior Ideb das 15 regiões administrativas em que é dividido o Estado. Só na cidade de Rio Preto, por exemplo, o Ideb da 4ª série foi de 5,2, próximo da média 6 considerada pelo MEC como o índice que teriam países desenvolvidos. O gasto por aluno na região também é alto, o segundo maior de São Paulo. Mesmo assim, está em quarto lugar na eficiência, com 20,5% de desperdício.
Já a região de Barretos teve o segundo melhor Ideb (por volta de 4,5), mas registra o quarto menor gasto com educação do Estado. Daí vem a posição privilegiada no ranking de eficiência. A área de Franca, que inclui Ituverava, Batatais e Orlândia, tem o maior gasto por aluno de São Paulo. A cidade de Franca, por exemplo, investe R$ 3.578,70 por estudante, ao ano, segundo informações da FGV baseadas em dados dos orçamentos municipais. No ranking da eficiência, a região está em penúltimo lugar. A média do custo/aluno no Estado varia de R$ 2 mil a R$ 4 mil anuais.
ESTRATÉGIAS DIFERENTES
Segundo a Constituição, os Estados e municípios devem destinar, no mínimo, 25% de seus orçamentos para a educação. No Brasil, as verbas para o ensino público correspondem a 4% do PIB nacional. Mas a sociedade e até o MEC têm defendido o aumento do índice. ¿Pedimos sempre mais recursos para a educação. Dinheiro é bom, mas às vezes o que falta é a gestão dos recursos¿, diz o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Reynaldo Fernandes. Para ele, que cuida do órgão responsável pelas avaliações sobre o ensino brasileiro, é importante que surjam pesquisas sobre como os governantes usam as verbas, o que ainda é raro na educação.
Para a educadora da USP Silvia Colello, a eficiência pode significar estratégias diferentes em cada cidade. ¿Em um lugar onde faltam vagas, o resultado vem quando se constrói mais escolas. Em outro onde esse problema já está superado, é preciso investir em qualificação de professores¿, explica. Em Barretos, a prefeitura já conseguiu implementar o ensino em período integral em 70% das escolas, algo defendido por especialistas para melhorar a qualidade da educação (mais informações na pág. A28). Outra cidade que se destaca na eficiência, como Lavínia, na região de Araçatuba, contratou materiais didáticos de um sistema privado, pagando R$ 155 por aluno, por ano, e foi umas das melhores redes do País no Ideb.
A Baixada Santista, com Ideb intermediário e a pior eficiência do Estado, enfrenta problemas de falta de professores e alta repetência. O presidente da Câmara da Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, César Callegari, se diz surpreso com o resultado. ¿São municípios com forte arrecadação de IPTU, principalmente por causa das casas de veraneio que não colocam seus filhos na escola da cidade¿, lembra.
O estudo da FGV foi realizado por oito professores do Centro de Estudos de Política e Economia do Setor Público. Foram avaliadas 404 cidades paulistas; 63% do total. Os dados são de 2005, pois o trabalho começou a ser feito no ano passado, quando o MEC ainda não havia divulgado o Ideb 2007 (o índice é bienal), o que ocorreu em junho de 2008.
De lá para cá, a maioria das cidades do Brasil melhorou seus Idebs. No entanto, a arrecadação também cresceu, o que torna difícil dizer se haveria mudanças de 2005 para hoje. Os prefeitos, que neste ano tentam a reeleição ou pretendem eleger seus sucessores, estavam em seus primeiros anos de mandato quando os dados foram coletados.
Para o especialista em estatísticas educacionais da Universidade Federal de Minas Gerais José Francisco Soares, apesar do mérito de inovar ao analisar a gestão dos gastos, o estudo peca porque dá a impressão de que existe apenas um modelo para o ensino eficiente. ¿Ele sugere que, se todos os municípios fizessem o mesmo que o mais eficiente, daria tudo certo¿, diz. ¿Mas há variáveis, como background familiar diferente e IDH da cidade, que influenciam no resultado e não foram consideradas. A educação tem espaço para mais de um vencedor.¿
IMPRESSÕES
Paulo Arvate Coordenador do estudo
¿Os municípios mais eficientes são os que têm melhores resultados com menos dinheiro. É uma questão de gestão¿
José Francisco Soares Especialista em estatísticas educacionais
¿Há variáveis que influenciam o resultado e não foram consideradas. A educação tem espaço para mais de um vencedor¿