Título: Bolívia adota política ambígua sobre coca
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2008, Internacional, p. A28

Dependente da cooperação americana, governo age para evitar expansão de cultivos

Simon Romero

O presidente boliviano, Evo Morales, um ex-plantador de folha de coca, é tanto um adversário como um parceiro ativo da política antidrogas americana para a região. Com muita freqüência, ele descreve os Estados Unidos como seus maiores adversários e fez do direito de cultivar a folha de coca um símbolo de soberania e antiimperialismo.

Entretanto, ele também chegou a extremos inesperados para conter o cultivo da coca, e aceita cerca de US$ 30 milhões por ano dos EUA - quase todo seu orçamento antidrogas - para combater a cocaína.

Por enquanto, Evo e os Estados Unidos permanecem como parceiros incômodos. Evo tem hesitado em cortar os laços com Washington, em especial por causa dos US$ 100 milhões anuais em ajuda ao desenvolvimento. Os EUA também concedem acesso a seu mercado, livre de impostos, aos têxteis bolivianos, uma salvação econômica para a Bolívia.

¿Evo Morales não pode simplesmente aceder às demandas americanas depois de ter sido democraticamente eleito por uma grande massa de camponeses indígenas zangados e famintos que não vêem nenhuma alternativa real para eles e para seus filhos¿, disse Bruce Bagley, um especialista em políticas antidrogas andinas da Universidade de Miami.

Mas, numa guerra às drogas em que se multiplicam contradições, Evo está fazendo mais que que os especialistas antidrogas acreditavam quando ele chegou ao poder.

Na época, alguns advertiram que sua presidência marcaria um retorno ao início dos anos 80, quando governos militares permitiram que a produção de coca se expandisse no Chapare, desestabilizando o país. Mas Evo tem sido zeloso em mostrar que não governa um narco-Estado e trabalha com os americanos.

O cultivo da coca aumentou nos seus dois primeiros anos no cargo, mas, em vez de explodir, subiu apenas 8% em 2006 e 5% em 2007, segundo a ONU. Isso ainda situa a Bolívia muito atrás do maior produtor mundial de coca, a Colômbia. Apesar de ser a mais ardorosa aliada do governo de George W. Bush na região, a Colômbia teve um aumento de 27% no cultivo de coca no ano passado e continua sendo a maior fonte da cocaína contrabandeada para os EUA.

Numa virada de seu pensamento pró-coca, Evo também tem procurado reprimir a cocaína. Primeiro, num aceno para os plantadores da folha de coca, ele quase dobrou a quantidade de terra que os plantadores podiam dedicar legalmente ao cultivo.

Mas depois tentou fazê-los aderir a uma nova regra que os impede de dedicar mais de um quinto de hectare para o cultivo de coca.

As autoridades americanas em geral têm evitado uma disputa pública com Evo sobre políticas da coca, em parte porque a cooperação antidrogas entre eles é muito frágil.