Título: Argentina vai quitar dívida de US$ 6 bi com Clube de Paris
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/09/2008, Economia, p. B6
A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, anunciou ontem que pagará a dívida com o Clube de Paris. No total, serão US$ 6,706 bilhões a serem cancelados com reservas do Banco Central argentino. Embora a operação estivesse na agenda desde a campanha eleitoral no ano passado, o anúncio foi inesperado. Em um recado direto aos mercados, onde recentemente surgiram diversos rumores sobre um possível novo calote, a presidente destacou que a decisão marca a ¿vontade de pagamento¿ do país.
O anúncio trouxe efeitos imediatos, como a alta dos bônus da dívida argentina. Mas com o pagamento, o nível das reservas do Banco Central cairá para cerca de US$ 41 bilhões. A medida, afirmaram os analistas, permitirá que a presidente - abalada pela recente crise com o setor ruralista, a escalada da inflação e escândalos de corrupção - ganhe ¿oxigênio¿ e tenha a imagem fortalecida, tendo em vista as eleições parlamentares do ano que vem.
Analistas destacaram que o pagamento da dívida com o Clube de Paris permitirá que a Argentina deixe de ser pária dos mercados, e volte ao sistema internacional de créditos. O ex-vice-ministro da economia Orlando Ferreres considera que a dívida com o Clube de Paris, embora ¿pequena¿ é ¿paralisante¿. Um dos principais empresários do país, Enrique Pescarmona, festejou a medida que, para ele, implicará na queda de juros internacionais para o país. ¿Voltamos ao mundo. É um bom uso das reservas do BC.¿
Já o economista Manuel Solanet não esperava um pagamento à vista. Segundo ele, ¿era evidente a necessidade de restabelecer as relações financeiras com o mundo.¿ Mas a forma de pagamento não é a mais conveniente. ¿Desta forma, os riscos para o país aumentam em um contexto internacional de turbulências financeiras¿.
Há poucos dias, o governo dos EUA havia indicado mal-estar pela demora da Argentina em pagar a dívida com o Clube. Na semana passada, o Banco da Espanha considerou arriscado investir no país.
Com a medida, Cristina pretende ainda dissipar os rumores sobre as potenciais dificuldades de o país honrar compromissos financeiros nos próximos anos, especialmente a partir de 2010. O fantasma de um novo calote provocou, ao longo de agosto, a queda dos valores dos bônus argentinos, o aumento da taxa de risco do país e a redução da nota da Argentina por parte das agências qualificadoras.
VENEZUELA
A medida permitirá reduzir a dependência financeira da Argentina com o governo do presidente venezuelano Hugo Chávez. Nos últimos três anos, a Venezuela transformou-se na única fonte de financiamento externo do país. De lá para cá, Chávez adquiriu US$ 9,2 bilhões em títulos argentinos, embora em troca de uma alta taxa de juros e de constrangedor respaldo político. No entanto, Cristina nada disse sobre uma hipotética negociação da dívida com os ¿holdouts¿, credores que ficaram de fora da reestruturação da dívida pública realizada em 2005 pelo então presidente Néstor Kirchner.