Título: Decisão de 2006 burlou teto para parlamentares
Autor: Lopes, Eugênia
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2008, Nacional, p. A15

Levantamento feito há dois anos indicava que 100 deles engordavam salários com aposentadorias

Aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro da Defesa, Nelson Jobim, revela-se praticamente uma exceção ao abrir mão de salário de R$ 10,7 mil como ministro do governo Luiz Inácio Lula da Silva e receber apenas seus proventos do tribunal. Apesar de a Constituição estabelecer que a soma de todas as remunerações dos servidores públicos ou de ocupantes de cargos eletivos não pode ultrapassar o salário mensal de ministro do STF, de R$ 24,5 mil, a regra não é cumprida nem mesmo por quem fez a lei.

Levantamento feito no Congresso há dois anos apontou que cerca de 100 parlamentares - ou seja, um sexto dos deputados e senadores - engordavam seus salários (hoje de R$ 16,5 mil) com aposentadorias. Esse acúmulo foi legalizado pelas Mesas Diretoras da Câmara e do Senado no início de 2006, permitindo que parlamentares e servidores do Congresso furem o teto. O artigo 37 da Constituição prevê que, na soma de todas as remunerações, estão incluídas as ¿vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza¿, como horas extras e gratificações.

Na nova legislatura, que começou em fevereiro de 2007, uma dezena de novos parlamentares procurou a direção do Congresso para saber se era necessário abdicar da aposentadoria ao assumir o mandato. Foi o caso do deputado Alberto Silva (PMDB-PI), ex-engenheiro da Estrada de Ferro Central do Brasil, ex-governador do Piauí e ex-contribuinte do INSS.

Mesmo procedimento foi adotado pelo deputado Albano Franco (PSDB), que, segundo denuncia do Ministério Público de Sergipe, receberia mais de R$ 22 mil como ex-governador. O senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) é outro que receberia aposentadoria de ex-governador, segundo a denúncia.

Na lista estariam ainda o ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP), ex-diretor do Tribunal de Justiça e ex-governador do Maranhão; o senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), ex-funcionário do Banco do Brasil (BB) e ex-governador do Maranhão; e o senador Francisco Dornelles, ex-secretário da Receita Federal. Recém-aposentado como ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), o deputado Humberto Souto (PPS-MG) é outro que usufrui de aposentadoria junto com salário.

O descumprimento da Constituição ocorre desde 1998, quando foi promulgada a reforma administrativa que estabeleceu o atual teto. Em 2004, seis meses depois da promulgação de emenda constitucional 41, que deixou ainda mais claro o teto salarial, a direção da Câmara tentou operacionalizar os cortes, determinando que todos os deputados e servidores se recadastrassem, informando se acumulavam outros salários.

O primeiro a se queixar formalmente foi o jurista Célio Borja, que acumula duas aposentadorias, de ex-ministro do STF e de ex-deputado, beneficiário do extinto Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC).

Em março de 2006, a direção da Câmara decidiu seguir decisão já adotada no Senado e ¿autorizar, provisoriamente, a aplicação do teto em separado na acumulação de rendimentos, considerando-se cada remuneração isoladamente, até que seja regulamentada a matéria e criado o sistema integrado de dados de que trata a Lei 10.887, de 2004¿. Aí o teto provisório tornou-se permanente.