Título: Brasil não pode usar dinheiro do pré-sal para liquidar dívida
Autor: Gobetti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2008, Economia, p. B4
Estudos internacionais mostram que países como o Brasil, endividados e com altas taxas de juros, deveriam priorizar a utilização das receitas do petróleo para reduzir a dívida pública no conceito bruto em vez de investir o dinheiro no exterior, por meio de fundo soberano. No caso do Brasil, entretanto, a recomendação não pode ser seguida por enquanto e não apenas porque as receitas do petróleo ainda são insuficientes para o País obter superávit nominal.
A necessidade de conter a demanda agregada e manter os juros altos estão impedindo o Brasil de usar plenamente seu superávit primário para pagar a dívida pública. Em vez disso, parte dos recursos economizados são depositados numa conta do Tesouro Nacional junto ao Banco Central. Quando o valor desse e outros ativos do governo são subtraídos do valor bruto da dívida, temos o que os economistas chamam de ¿dívida líquida do setor público¿.
Atualmente, por exemplo, a dívida líquida é de 40,6% do Produto Interno Bruto (PIB), mas a dívida bruta chega a 55,6% e não tem sido reduzida na mesma velocidade, porque parte do superávit primário é mantido parado no caixa. Se o Tesouro decide usar esse recurso para resgatar os títulos públicos, como nos últimos meses, o Banco Central precisa agir para enxugar essa liquidez por intermédio da emissão de seus próprios títulos. O resultado é que, no agregado, a soma de títulos que fazem parte da dívida pública continua igual (como proporção do PIB), apesar do maior superávit.
Para um cidadão comum, essa situação parece ser irracional, pois a lógica recomenda que, se eu tenho uma dívida cara em um banco X e dinheiro parado na conta de outro banco Y, eu saque esse dinheiro para abater o meu débito na primeira instituição. No caso de uma economia, entretanto, essas relações são mais complexas.
¿Se o Tesouro quitasse a dívida, devolveria ao setor privado o poder de compra que retirou com o aumento de receita, sem contribuir com o BC para o enxugamento da liquidez¿, explica o economista José Cosentino Tavares, da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados.
Todos concordam que a atual situação é prejudicial aos cofres públicos, mas esperam que a melhoria das condições fiscais contribua para a queda da taxa de juros, reduzindo não só o custo da dívida, como possibilitando sua redução em termos brutos. ¿Nada será melhor para as gerações futuras do que abater a dívida bruta cara¿, diz o economista Fábio Giambiagi.
Quando o Brasil se tornar um exportador de petróleo, entretanto, esse mesmo problema pode se reapresentar de outra forma: se o governo decidir comprar os dólares (com ou sem fundo soberano) que entrarão no País para evitar a apreciação do real, precisará emitir títulos da dívida pública ou fazer um superávit primário muito maior. Do contrário, a liquidez da economia aumentará abruptamente, gerando pressões inflacionárias.