Título: Incentivo a transplante terá R$ 60 mi
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/09/2008, Vida, p. A20

Pacote prevê bonificação a equipe médica bem-sucedida na captação e aproveitamento de órgão e uniformiza fila

Lígia Formenti, BRASÍLIA

Os critérios da fila de transplante de órgãos serão padronizados para todo o País e haverá um incentivo estimado em R$ 60 milhões para impulsionar a realização das cirurgias. As mudanças, anunciadas ontem, integram um pacote do Ministério da Saúde que prevê o reajuste dos valores pagos às equipes de transplante dos hospitais, que receberão bonificação de 100% pelas cirurgias realizadas.

Veja detalhes do pacote do ministério para os transplantes

Além de uniformização nos critérios, será instalado um sistema que vai permitir a pacientes cadastrados acompanhar o andamento da fila em todo o País pela internet. Tal medida, avalia o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, poderá dar maior transparência ao processo, evitando ¿tentativas de fraude e irregularidades¿.

Atualmente, as regras da fila de transplante são genéricas, o que dá espaço para Estados adotarem alguns critérios diferentes. ¿Não é nada ilegal, mas é indesejável¿, disse o diretor do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame. Os critérios de fila integram o novo Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes, que será submetido a consulta pública por 60 dias. ¿Pode haver falhas¿, reconheceu Beltrame. ¿Este é o momento de os setores interessados se manifestarem.¿

O regulamento também prevê o sistema de ¿doador expandido¿, que permite a doação de órgãos de portadores de hepatites B e C, aids, doença de Chagas e alguns tipos de tumores. Isso pode ser feito desde que haja consentimento do receptor.

Além de ações para ampliar a transparência, o ministério lançou uma nova campanha publicitária para doação de órgãos, que deverá ser veiculada até 12 de outubro.

DESPERDÍCIO

Outro problema que preocupa o ministério é que atualmente, por falhas no sistema, muitos órgãos que potencialmente poderiam ser doados não são utilizados. Pelas contas do ministério, apenas 50% dos potenciais doadores falecidos são notificados. Desse total, só 20% se tornam doadores. Quanto menos órgãos são aproveitados, maior o tempo de espera na fila - onde há hoje 71.349 pacientes.

Uma das medidas para tornar o sistema mais produtivo estabelece um bônus de 100% para instituições que conseguirem efetivar o transplante. ¿Essa medida poderá ajudar a colocar em funcionamento as Organizações de Procura de Órgãos, previstas em norma mas que, em muitos casos, não são atuantes¿, afirmou o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Silvano Raia.

¿Essa bonificação traz um incentivo maior para que equipes identifiquem potenciais doadores¿, concordou José Medina Pestana, da Sociedade Brasileira de Transplantes de Órgãos.

Uma parceria entre o Serviço Nacional de Transplante e Hospital Sírio-Libanês também deverá ser implementada, para induzir a formação de centros de transplante em 16 Estados que ainda não realizam a procedimento. Além disso, foi feito um reajuste na tabela de transplantes e definido um mecanismo para reembolsar exames necessários para doação feitos em hospitais que não estão credenciados no Sistema Único de Saúde.

¿Atualmente, pacientes com planos de saúde têm mais facilidade de fazer os testes, o que, indiretamente, torna o acesso à fila desigual¿, avaliou Medina.

O Brasil é o segundo país na realização de transplantes. De janeiro a junho, foram feitas 8.365 operações, um número 15,68% maior do que no primeiro semestre de 2007.

DOSE DUPLA

Balanço da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo aponta crescimento expressivo de um tipo de transplante conhecido como split-liver - um mesmo fígado é dividido e enxertado em dois pacientes, normalmente uma criança e um adulto. De julho de 2006 a julho deste ano, foram realizados 31 transplantes do tipo em São Paulo, quase oito vezes mais do que nos dois anos anteriores.

Segundo a pasta, isso é fruto indireto da mudança das regras para a fila do fígado, cujo critério principal passou a ser a gravidade do paciente, não mais a data de inscrição na lista de espera.

Com pontuação diferenciada, as crianças começaram a passar na frente dos adultos na hora da seleção. Como a maioria dos doadores é adulto, é possível dividir o órgão e salvar duas vidas.