Título: A fisionomia destas eleições
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2008, Notas & Informações, p. A3
Dias atrás, o presidente nacional do PSDB, o senador pernambucano Sérgio Guerra, fez um comentário que parece refletir fielmente o panorama político do País ao se completar a primeira fase do ciclo das eleições municipais. ¿A oposição no Brasil está muito fraca, a oposição em geral¿, observou. ¿Os governadores, os prefeitos - incluindo os nossos - quase não têm oposição.¿ Ou, quando têm, poderia ter acrescentado, ela não chega a tirar o sono da maioria dos governantes. Isso é o que explica as previsões segundo as quais dos 20 prefeitos de capitais candidatos à reeleição (de um total de 26), 17 têm chances ponderáveis de conservar os seus mandatos; pelo menos terminaram a campanha para o primeiro turno como favoritos nas pesquisas. E, em dois casos - Belo Horizonte e Recife -, os candidatos dos atuais titulares poderão liquidar a disputa já amanhã.
Esse padrão não é exclusivo das capitais ou do chamado G-79, em alusão ao número de centros com mais de 200 mil eleitores, onde a eleição se decide, se necessário, em duas etapas. Considerando o conjunto dos 5.563 municípios brasileiros, analistas políticos acreditam que o índice de reeleição de prefeitos este ano deverá superar a marca de 58% dos que se recandidataram nos dois pleitos passados. Os políticos foram os primeiros a perceber a direção do vento. Segundo uma tabulação da Confederação Nacional dos Municípios, citada pela colunista Maria Cristina Fernandes, do jornal Valor, dos 4.368 prefeitos reelegíveis, 77% se candidataram - um porcentual inédito. Sabe-se que, em toda a parte onde é seguida, a regra que admite a reeleição dos mandatários executivos tende a jogar a seu favor: em princípio, a propensão do eleitorado é antes mantê-los do que removê-los.
Mesmo com isso em mente, chama a atenção - pelo que exprime da atualidade política nacional - a possibilidade de os brasileiros virem a reeleger agora 60% ou mais dos prefeitos que disputam o seu voto. É onde entra o comentário do tucano Sérgio Guerra sobre o definhamento das oposições no País. À parte as suas deficiências próprias (de que o PSDB é exemplo eloqüente), os oposicionistas pouco podem, ao que tudo indica, diante do sentimento generalizado de que as coisas vão bem. O feel-good factor, como dizem os americanos, não beneficia só o presidente Lula, com os seus índices sem precedentes de popularidade. Embora não na mesma escala, a aprovação aos prefeitos e governadores é hoje maior, em média, do que há quatro anos. Em parte, por uma espécie de efeito-contágio; mas em parte também porque Estados e municípios têm podido fazer mais graças ao aumento da arrecadação e dos valores transferidos pela União, um subproduto da bonança econômica.
Os ganhos eleitorais, evidentemente, não se distribuem por igual entre os partidos. A crer nas sondagens e no faro dos políticos, o PT desponta em âmbito nacional como o grande vitorioso da temporada. Na eleição de 2004, o sucesso (da chegada de Lula ao Planalto) subiu à cabeça da direção petista, levando-a a imaginar que a legenda faria nada menos de 800 prefeitos. Fez pouco mais da metade disso. Este ano, embora, escaldado, o partido guarde para si as suas previsões, a expectativa dos analistas é de que a sigla vença em cerca de 600 municípios. No bloco do G-79 (as 26 capitais e as 53 maiores cidades do País), que reúne perto de 47 milhões de votantes, ou mais de 1/3 do eleitorado brasileiro, se o desfecho da disputa confirmar as projeções baseadas nas últimas pesquisas, o PT elegerá 22 candidatos, ante 16 do PMDB e 13 do PSDB. No pleito anterior, foram 18, 9 e 17, respectivamente.
Se assim for, o PMDB exibirá notável recuperação, por sua forte presença na coalizão lulista. De todo modo, numa perspectiva mais ampla, o PT continua sendo o único dos grandes partidos a aumentar sistematicamente a sua participação nos governos municipais - um desempenho que empalidecerá perto de uma eventual derrota das suas candidatas Marta Suplicy, em São Paulo, e (secundariamente) Maria do Rosário, no seu reduto histórico de Porto Alegre. No primeiro caso, é notório que está em jogo a sucessão presidencial de 2010, razão por que Lula se engajará com ¿força total¿ no segundo turno.