Título: Justiça declara que coronel Ustra foi torturador
Autor: Macedo, Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/10/2008, Nacional, p. A13

A Justiça de São Paulo declarou torturador o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, que durante parte do governo militar comandou o Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), reduto da repressão a opositores do regime. Em ação de caráter declaratório, o juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível da capital, reconheceu responsabilidade de Ustra por violências contra a família Teles, capturada em 1972 sob acusação de envolvimento com uma gráfica do PC do B, à época agremiação clandestina. O juiz definiu o DOI de Ustra como ¿casa dos horrores¿.

É histórico o revés judicial do coronel, que desde os anos 70 publicamente vem sendo apontado como torturador, o que ele nega. Hoje vivendo em Brasília, ele é alvo de outras demandas promovidas por ex-prisioneiros políticos que o acusam e pelo Ministério Público Federal, que abriu investigação sobre mortes supostamente a seu mando.

A sentença declara a existência de ¿uma relação jurídica¿ entre Ustra e seus acusadores - Maria Amélia de Almeida Teles, seu marido, César Augusto Teles, e sua irmã Criméia Schmidt de Almeida, os três que subscrevem a ação declaratória alegando que foram espancados pelo militar. A família pede apenas que a Justiça reconheça a participação do militar em agressões nas celas do DOI. Ustra também comandou a Operação Bandeirante (OBAN), núcleo de informações e investigações montado pelos militares em 1969 com financiamento de empresários.

Contra a decisão cabe recurso. O juiz escreveu: ¿Na contestação, o próprio réu informou que comandou o DOI-Codi do II Exército e dirigiu a OBAN entre 29 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974. Os testemunhos são justamente da época em que lá estavam presos os autores César Augusto, Maria Amélia e Criméia. Do que disseram as testemunhas, extrai-se que o local era realmente uma `casa de horrores¿, razão pela qual o réu não poderia ignorar o que ali se passava.¿

Segundo o juiz, ¿ainda que as testemunhas não tenham visto todos esses três autores serem torturados especificamente pelo réu, este não tinha como ignorar os atos ilícitos absolutos que ali se praticavam, pois o comando do DOI-Codi e a direção da OBAN estavam a seu cargo¿.

¿Não é crível que os presos ouvissem os gritos dos torturados, mas não o réu¿, prosseguiu Santini. ¿Se não o dolo, por condescendência criminosa, ficou caracterizada pelo menos a culpa, por omissão quanto à grave violação dos direitos humanos fundamentais dos autores, os quais certamente sofreram danos morais, pois tortura é ato suficiente, por si só, para provocar lesão à esfera jurídica extrapatrimonial da pessoa, como decorrência de sua condição humana.¿

Paulo Esteves, advogado de Ustra, disse que vai recorrer. ¿Em ação similar, o Tribunal de Justiça decidiu há duas semanas que por meio de declaratória não se pode produzir prova dessa natureza. Defendo Ustra porque acredito que ele nunca torturou ou mandou torturar. A prova dos autos não permite conclusão de que torturou. Não é uma prova isenta, é viciada pela parcialidade.¿