Título: País busca tecnologia para escavação no Araguaia
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/10/2008, Nacional, p. A15

O governo brasileiro pretende obter da Espanha tecnologias para eventual escavação no Araguaia em busca de corpos de desaparecidos durante o regime militar. Na segunda-feira, enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebia o prêmio Dom Quixote de La Mancha, na cidade de Toledo, uma delegação do governo permaneceu em Madri para reuniões com o juiz espanhol Baltasar Garzon, que lidera o processo de investigação sobre o desaparecimento de milhares de espanhóis nos últimos 70 anos.

Na segunda-feira, o ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannucchi, reuniu-se com Garzon para conhecer seu trabalho. Um dos pontos que chamaram sua atenção foi o uso de sondas, georradares e tecnologias avançadas para identificar onde estão os corpos das vítimas.

Uma das idéias da delegação brasileira é saber como funcionam essas técnicas para eventual implementação no Brasil, principalmente na região da guerrilha do Araguaia, onde se acredita possam existir corpos enterrados. Como não seria possível escavar toda a região, a idéia seria usar esses detectores, sondas e instrumentos tecnológicos para ampliar as buscas.

O que chamou a atenção do governo brasileiro foi a preparação da Espanha em busca do corpo do poeta Federico García Lorca. Para sua busca estão sendo preparados geólogos, arqueólogos, historiadores, especialistas em DNA e mesmo em tecnologia de radares.

O poeta foi morto na guerra civil espanhola nos anos 30 e está se tornando o ícone da tentativa do país de superar os traumas de seu conflito mais violento do século 20. Para muitos, a busca pelo poeta que marcou a literatura espanhola poderá ser um divisor de águas na história do país, em busca não apenas de seu corpo, mas principalmente de uma justiça póstuma.

Por anos, a família de García Lorca foi contra a busca de seu corpo, apresentando argumentos diferentes. Um dos rumores era de que teria entrado em acordo com Franco e levado o corpo da fossa comum para o jardim de uma das casas da família no sul da Espanha. Mas historiadores garantem que esse acordo não passa de especulação.

Caso Garzon dê sinal verde para que as buscas comecem, a Universidade de Granada garante que já está pronta para atuar, inclusive com o uso de georradares. Alguns dos membros da equipe já atuaram no Chile, em valas supostamente feitas pelos partidários do general Augusto Pinochet.

Mas o juiz ainda enfrenta resistências. Grupos mais conservadores acreditam que não está na hora de abrir as valas nem as feridas da guerra civil. A Conferência Episcopal, por exemplo, afirmou que não era competente para abrir as portas de suas paróquias ao juiz a fim de que investigasse se há algum registro dos desaparecidos.