Título: Hemocentros culpam ministério
Autor: Formenti, Lígia
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/10/2008, Vida &, p. A20

Orientações técnicas falhas emitidas pelo Ministério da Saúde estariam na origem do prejuízo de US$ 6,82 milhões provocado pela perda de matéria-prima utilizada na produção de produtos para o tratamento de hemofílicos, segundo informaram as fundações envolvidas no caso.

As fundações Pró-Sangue, de São Paulo, e Hemominas, de Minas Gerais, afirmam que seguiram à risca as orientações despachadas pelo ministério e pela empresa LFB sobre o armazenamento do plasma que seria usado para a fabricação de hemoderivados fator 8 e fator 9 - proteínas que estimulam a coagulação do sangue de pacientes com hemofilia.

Cerca de 260 mil bolsas de plasma dos dois hemocentros foram consideradas inadequadas para a produção desses dois hemoderivados pela LFB, uma multinacional francesa, contratada para fazer o fracionamento, técnica que transforma o plasma sanguíneo em quatro produtos médicos.

OS ESTOQUES

Inspeção feita pela LFB constatou, por exemplo, que o plasma estava estocado em lugares sem refrigeração adequada, porque havia uma quantidade excessiva de caixas nos armazéns, e com falhas na limpeza, poeira e fungos.

Agora, o material poderá ser usado somente para obtenção de outros dois hemoderivados: albumina e imunoglobulina. Com a recusa da LFB em produzir o fator 8 e o fator 9, perde-se matéria-prima para abastecer a demanda de pacientes brasileiros com hemofilia por uma semana, segundo o próprio Ministério da Saúde.

A Fundação Hemocentro, de São Paulo, afirma que os armazéns foram inspecionados duas vezes por equipes do ministério. E, nas duas ocasiões, a forma de armazenamento teria sido aprovada pelos fiscais de Brasília.

O plasma nos estoques dos dois hemocentros havia sido coletado a partir de 2004, ano em que um contrato para o fracionamento do produto no exterior havia terminado.

Nos últimos anos, os hemocentros armazenaram o produto, por força de um contrato com o Ministério da Saúde. Uma nova licitação foi feita em 2007. A ganhadora, a francesa LFB, contratada por R$ 50 milhões, ficou encarregada de captar o plasma e fracioná-lo no exterior.

QUANTIDADE

Pelo contrato, a empresa é obrigada a fornecer, para determinado volume de plasma, uma quantidade determinada de quatro hemoderivados: albumina, imunoglobulina, e os fatores 8 e o 9.

Anteontem, ao comentar o episódio, o diretor do departamento de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, Alberto Beltrame, atribuiu a recusa da LFB à ¿hiperexigência¿ da empresa.

Chegou a dizer que ¿apostava os dedos¿ como parte do produto reprovado poderia ser usado para fazer os fatores 8 e 9. Segundo ele, tanto a Pró-Sangue quanto o Hemominas já haviam sido questionados sobre os motivos de o plasma não ter sido aprovado.

Anteontem, ele disse que não havia recebido nenhuma resposta. Mas o Hemominas informa que enviou sua justificativa. O Ministério da Saúde foi procurado pela reportagem ontem para tratar sobre o assunto. Em uma nota enviada às 19h30, o ministério sustenta que as normas para armazenamento do plasma foram definidas em um reunião de 2005 e que todos os hemocentros são obrigados a saber quais medidas devem ser tomadas. No texto, o ministério contesta a informação dada pela Fundação Pró-Sangue. Ao contrário do que diz a fundação paulista, ele sustenta que ¿a vistoria do Ministério da Saúde, realizada em junho deste ano, apurou que a Fundação Pró-Sangue não havia validado o controle de temperatura¿. E teria sido a ausência de validação o motivo de a LFB haver recusado o produto que estava estocado.

NÚMEROS

R$ 50 milhões é o valor do contrato firmado com a empresa multinacional francesa LFB para que ela realizasse o processamento das bolsas de plasma

260 mil bolsas de plasma foram consideradas inadequadas para a extração de fator 8 e 9