Título: Indústria argentina quer a desvalorização do peso
Autor: Guimarães, Marina
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/10/2008, Economia, p. B13
Assustados com a disparada do dólar no Brasil, empresários argentinos aumentaram a pressão pela desvalorização do peso. A União Industrial Argentina (UIA) divulgou nota ontem, alertando para o risco que o país sofre se o peso não acompanhar o ritmo cambial externo. ¿O persistente aprofundamento da crise internacional tem aumentado a desvalorização das principais moedas em relação ao dólar e com isso está afetando notoriamente a competitividade de nosso país¿, diz o texto.
¿O real brasileiro se desvalorizou cerca de 51%, o peso chileno 51%, o mexicano 36,7% e o euro quase 25%¿, calcula a UIA, afirmando que durante a reunião do comitê da entidade, os empresários do interior mostraram como indústria está sendo afetada pela desvalorização das moedas dos parceiros comerciais. O texto alerta: ¿Se não houver um conjunto de ações para amortizar esses impactos, as conseqüências futuras serão profundas não só para o nível de atividade, mas fundamentalmente para as exportações e o nível de emprego¿.
Apesar do tom ameaçador, o Banco Central da Argentina está decidido a manter o peso entre 3,20 a 3,26 por dólar. Fonte muito próxima ao BC revelou à Agência Estado que, embora o governo não consulte o presidente da entidade, Martín Redrado, para adotar medidas como a que elimina os fundos de pensão, por exemplo, está consciente de que conter a alta do dólar é fundamental ao país.
A presidente Cristina Kirchner ¿sabe que, se a divisa subir, haverá uma corrida pelo dólar porque na Argentina, ao contrário do Brasil, em momentos de turbulência, quando o cidadão comum começa a desconfiar, o primeiro que faz é correr à casa de câmbio¿, diz a fonte. ¿Esses níveis de flutuação da moeda no Brasil, se ocorressem aqui, no segundo dia haveria filas enormes nas casas de câmbio.¿
Apesar das boas relações com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo argentino definiu que é preferível uma guerra comercial com o Brasil a uma fuga de capitais e uma corrida pelo dólar. Por isso, o instrumento do governo para conter uma ¿invasão¿ de produtos brasileiros serão medidas de proteção ao mercado, como salvaguardas e outras ferramentas aplicadas pelo comércio exterior, sem tocar no câmbio.
A fonte contou que ¿nunca as relações entre os BCs dos dois países estiveram tão fluidas como agora¿. Desde que começou a crise, Martín Redrado tem tido conversas telefônicas permanentes, além de vários encontros, com o presidente do BC brasileiro, Henrique Meirelles. Em dias como o de ontem, em que o dólar disparou e o BC teve de fazer swap cambial, Meirelles telefonou a Redrado para explicar o movimento brusco no Brasil.
Para o BC argentino, segundo a fonte ligada à autoridade monetária, o câmbio local não pode ser tocado enquanto a poeira não baixar no Brasil. ¿É preciso ver onde o real ficará parado¿, disse a fonte, afirmando que as estimativas do BC brasileiro são de que em dois meses, se não houver surpresa, a poeira já terá assentado e o real voltado a um nível entre R$ 1,90 e R$ 2 por dólar. Agora, se o real se mantiver na casa de R$ 2,30, a fonte reconhece que será complicado para a Argentina. Nesse caso, a proteção comercial aumentaria.
Sobre o sistema financeiro local, a fonte informou que ¿está sólido¿ e ¿os bancos aprenderam com a crise de 2001 e agora têm liquidez suficiente para enfrentar a turbulência¿. Além disso, ¿não temos outros fatores complicados como a exposição aos ativos tóxicos, como está ocorrendo no Brasil¿.