Título: PF prepara indiciamento de Protógenes por quebra de sigilo
Autor: Macedo,Fausto
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2008, Nacional, p. A4

Delegado que chefiou ofensiva contra Dantas pode ser indiciado também por interceptação sem aval da Justiça

Fausto Macedo

Protógenes Queiroz, mentor da Satiagraha, deverá ser indiciado em inquérito da Polícia Federal. Pelo menos dois crimes podem ser atribuídos ao delegado - violação de sigilo funcional e interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas sem autorização judicial.

O primeiro crime que a PF quer imputar ao delegado está previsto no artigo 325 do Código Penal, que pune com detenção de 6 meses a dois anos servidor que revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deve permanecer em segredo.

No auge da Satiagraha, Protógenes convocou grande efetivo da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) - pelo menos 72 agentes e oficiais - para compor a missão e a todos, estranhos à PF, abriu informações blindadas por ordem judicial.

Pelo outro crime, o da interceptação clandestina - artigo 10 da Lei 9.296/96 (Lei do Grampo) -, Protógenes fica sujeito, se processado, a uma punição mais pesada, reclusão de dois anos a quatro, e multa.

Algoz do banqueiro Daniel Dantas, a quem enquadrou formalmente por lavagem de capitais, evasão de divisas e quadrilha, Protógenes tornou-se o alvo principal do inquérito 24447/08 que foi aberto originalmente para investigar o vazamento de dados secretos da Satiagraha, cerco ao chefe do Grupo Opportunity.

Oficialmente, a PF não se manifesta sobre o indiciamento de Protógenes, mas nos bastidores caminha severamente nessa direção. Os movimentos da corporação apontam firmemente para o delegado que, atirado às cordas, vê-se praticamente isolado no departamento que integra há 10 anos.

No curso do inquérito 24447/08, a PF identificou os crimes que teriam ocorrido sob ordens de Protógenes. Na representação à Justiça pelas buscas de objetos do delegado, que é dado por "investigado", são lançadas suspeitas contundentes acerca de sua conduta. A PF anota que existem "elementos indiciários" contra o cérebro da Satiagraha.

Vicente Ernani Filho, oficial de Inteligência da Abin, revelou em depoimento que a PF forneceu 13 rádios Nextel, que foram distribuídos entre os arapongas da agência. "Utilizando os rádios eu mantinha os contatos necessários com o dr. Queiroz", disse Ernani. "O único equipamento pertencente à Abin era uma máquina fotográfica."

CAPÍTULOS

Protógenes caiu em desgraça quando ousou afrontar superiores, a quem acusou de boicotarem a Satiagraha em documento à Procuradoria da República. Alijado da investigação, o delegado afirmou que a cúpula da PF o abandonou no instante crucial da missão.

O primeiro passo revelador das intenções da Polícia Federal foi dado quarta-feira passada. Às cinco da manhã, Protógenes foi abruptamente despertado por uma equipe de federais, munidos de mandado judicial que os autorizava a uma busca minuciosa em 5 endereços seus. Além de notebook pessoal e documentos do delegado, a PF levou 7 celulares dele.

Indagado pelo Estado se teme ser indiciado, Protógenes disse: "Eu espero tudo, nada mais me surpreende. Não duvido de mais nada."

Sua exoneração dos quadros da PF não parece ser hipótese que o intimide. "Eu não nasci delegado."

O inquérito é dividido em capítulos. Um deles, "das mentiras constatadas", é dedicado exclusivamente ao desmonte da tese de Protógenes para o nome que ele próprio emprestou à operação contra Dantas: Satiagraha, segundo o delegado, é a busca incessante pela verdade.

A PF avalia "suficientemente evidenciados pelos depoimentos já colhidos elementos que permitem atribuir a autoria do delito capitulado no artigo 10 da Lei 9.296/96, em condutas autônomas, aos escrivães federais Roberto Carlos da Rocha, Eduardo Garcia Gomes e Walter Guerra da Silva, além dos elementos que já permitiram atribuir a mesma conduta ao delegado Protógenes Pinheiro Queiroz".

DELEGADO NA MIRA

As prisões

O delegado Protógenes Queiroz comandou a Operação Satiagraha, que em 8 julho levou para a prisão o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta, entre outras pessoas, acusados de evasão de divisas, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Eles negam

Atuação de arapongas

Dias depois, vem à tona informação de que arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) atuaram em parceria com a Polícia Federal na Satiagraha. Criticado por não ter notificado o comando da PF sobre a participação dos agentes, Protógenes pede afastamento da operação

O afastamento

Oficialmente, sua saída se deu em razão de um curso de aperfeiçoamento na Academia Nacional de Polícia, em Brasília. Mas nos bastidores setores da própria PF e do governo avaliaram que ocorreram excessos na operação

As acusações

Em documento que enviou à Procuradoria da República, no qual diz ter havido "obstrução às investigações" e boicote à Satiagraha, Protógenes denuncia que foi forçado a revelar informações sensíveis do caso - e que resistiu por serem estrategicamente protegidas pelo sigilo

O inquérito e as blitze

O inquérito 24447/08 foi aberto em julho para apurar o furo do sigilo que cercava a Satiagraha e tem Protógenes como alvo principal. Na semana passada, a Justiça Federal autorizou ordem de busca e apreensão em quatro endereços do delegado e no escritório da Abin no Rio

A defesa

Protógenes disse que as buscas e a aprovação do habeas corpus do STF em favor de Dantas fazem parte de "operação casada", uma "patranha", envolvendo a cúpula das duas instituições para desmoralizá-lo. "As buscas mostram o poder extremo a que chegou esse bandido e sua penetração nas altas esferas do poder"