Título: SP tem fila de 413 por indenização
Autor: Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/11/2008, Nacional, p. A16

Há casos de ex-presos políticos que aguardam desde 2003 para receber

Ricardo Brandt

Um grupo de 413 ex-presos políticos que ficaram detidos e sofreram torturas em São Paulo durante a ditadura militar aguarda na fila pelo pagamento das indenizações já oficialmente aprovadas pelo governo do Estado, mas que por causa dos recursos insuficientes ainda não foram pagas.

Há casos de indenizações aprovadas em 2003 cujos anistiados até hoje não viram a cor do dinheiro ou mesmo ex-torturados que estão com idade avançada aguardando a análise de seus pedidos, como o ferroviário aposentando Osmar Barbosa, de 81 anos.

Por 43 anos, Barbosa escondeu o que lhe aconteceu entre os dias 6 e 19 de abril de 1964, nos porões do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) de São Paulo. Torturado no pau-de-arara, espancado e ameaçado de morte, ele só contou seu sofrimento no ano passado, quando requereu indenização ao Estado e entrou em uma fila de 684 pedidos que faltam ser pagos ou analisados.

"Eu escondi porque tinha medo, tenho cinco filhos e 12 netos. Toda vez que chega dia 31 de março (dia do golpe militar), me dá uma angústia", revela o ex-ferroviário, com os olhos marejados, mostrando o protocolo de nº 140143, do Dops, em que foi fichado por "sabotagem". Ligado ao sindicalismo, Barbosa foi acusado de integrar o movimento que paralisou a Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, naquele dia 31 de março de 1964.

Para liquidar de uma vez a dívida que o Estado assumiu com os ex-presos do regime, o governador José Serra (PSDB) precisaria desembolsar pelo menos R$ 15 milhões. Em 2006, o então governador Cláudio Lembo (DEM) - que assumira no lugar de Geraldo Alckmin (PSDB), afastado para disputar as eleições presidenciais - chegou a prometer que quitaria a dívida.

Naquele ano foram disponibilizados no Orçamento R$ 5,3 milhões e pagos R$ 4,1 milhões - o que deu para cobrir os pagamentos de 175 indenizações.

"O problema hoje em São Paulo é que a cada ano os valores lançados no Orçamento são insuficientes e muitos dos beneficiados estão morrendo", aponta o presidente do Fórum dos Ex-Presos e Perseguidos Políticos do Estado de São Paulo, Raphael Martinelli.

DIREITO

Em São Paulo, lei (10.726/2001) aprovada pelo governador Mário Covas (PSDB), morto em 2001, prevê o pagamento de indenizações a pessoas que ficaram presas e sofreram torturas sob a responsabilidade ou guarda do Estado entre 31 de março de 1964 e 15 de agosto de 1979. Seus efeitos passaram a valer em 2002, quando o governador Geraldo Alckmin regulamentou a lei, criando a Comissão Estadual de Ex-Presos Políticos. A cada 15 dias, sempre às terças-feiras, 13 membros reúnem-se na Secretaria de Estado de Justiça para analisar os pedidos.

As indenizações são de dois valores: R$ 22 mil para pessoas que foram presas e/ou torturadas e R$ 39 mil para casos em que a prisão resultou em seqüelas permanentes ou morte.

"Em média, deliberamos 20 processos por sessão", explica o presidente da comissão, Ricardo Yamasaki. Ele admite que serão necessários pelos menos mais quatro anos para se pagar todas as indenizações. "O governador José Serra tem grande interesse em pagar tudo. É uma dívida que o Estado assumiu que tem", afirma.

De fato, apesar da demora nos pagamentos, representantes dos ex-presos elogiaram a política de indenizações do governo Serra, que aumentou os valores reservados no Orçamento. Para 2009 foram separados R$ 9 milhões, maior valor da rubrica desde que foi regulamentada a lei.

Ao todo, 2.084 pedidos de indenização foram apresentados, sendo que 1.550 deferidos até o momento e 1.137 efetivamente pagos - total de R$ 28 milhões. Apesar das indenizações serem de baixos valores, o montante reservado no Orçamento variava sempre em torno de R$ 4 milhões - o que gerou o atraso.