Título: Devastação suja a ficha de emissões do Brasil
Autor: Escobar, Herton
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/11/2008, Vida, p. A24
Corte da floresta torna País um dos cinco maiores emissores de gases-estufa do planeta
Herton Escobar
O etanol é a principal carta no baralho tecnológico brasileiro para convencer o mundo de que o País está fazendo a sua parte no combate ao aquecimento global. Até que o Brasil faça sua "lição de casa" na Amazônia, porém, será difícil cobrar os louros climáticos do etanol.
"Reduzir as emissões por combustíveis fósseis é sem dúvida um benefício enorme, mas também não há dúvida de que a redução do desmatamento teria um impacto maior", diz o engenheiro Manoel Regis Leal, do Centro de Energias Alternativas e Meio Ambiente do Ceará.
Tanto a floresta quanto o etanol estarão na pauta de discussões da próxima Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 14), que começa no mês que vem em Poznan, na Polônia. Será a última conferência antes da COP 15, em Copenhague, em dezembro de 2009, quando deverá ser fechado um novo acordo climático para substituir o Protocolo de Kyoto, que termina em 2012.
Hoje, só os países desenvolvidos têm obrigação de reduzir emissões, conforme metas estabelecidas em Kyoto (5% em média). A grande dúvida para o próximo acordo é até que ponto os países em desenvolvimento também deverão assumir compromissos para cortar carbono. O Brasil é contra a adoção de metas compulsórias e diz que já está fazendo sua parte no combate ao aquecimento global.
"Se tem um país que está contribuindo de maneira clara e decisiva para o combate às mudanças climáticas no mundo é o Brasil", disse recentemente o embaixador Everton Vargas, uma das principais lideranças diplomáticas do País no tema, durante reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). "Estamos fazendo a nossa parte, sim, e não é pouco", diz a especialista Suzana Kahn, do MMA e da Coppe-UFRJ.
"Acho que o Brasil não precisaria sair mal dessas reuniões, mas fica difícil com o que está acontecendo na Amazônia", avalia José Goldemberg, da USP, que há anos defende a adoção de metas nacionais para redução de emissões. "O argumento do etanol é válido, mas o Brasil não produz álcool para combater as mudanças climáticas, faz isso por outras razões."
O Brasil é hoje, graças ao desmatamento, um dos cinco maiores emissores de gases do efeito estufa. Mas sua contribuição histórica para o aquecimento global é pequena. "Não somos nenhum vilão. Mesmo com o desmatamento, nossa participação nas mudanças climáticas é muito baixa em relação a outros países", avalia o pesquisador Antonio Manzi, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus.
"Mas, no futuro, acho que temos de fazer parte obrigatoriamente da solução. E para nós é muito mais eficaz fazer isso via redução do desmatamento do que mudar nossa matriz energética", completa Manzi.