Título: Sem suspensão de direitos políticos, infiéis recuperam cargo pelo voto
Autor: Moraes, Marcelo de
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2008, Nacional, p. A4
Cassados pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) por infidelidade partidária, muitos vereadores conseguiram reverter a punição nas urnas, elegendo-se para um novo mandato na eleição deste ano. Com isso, perderão suas vagas nas Câmaras Municipais apenas por um curto período de tempo, reassumindo os postos já no próximo ano.
Levantamento feito pelo Estado em alguns dos maiores colégios eleitorais do País mostra que pelo menos 248 desses vereadores cassados obtiveram novo mandato nas urnas este ano. Em Minas, dos 250 que perderam o mandato, 94 foram eleitos novamente e um conquistou a prefeitura de sua cidade. Em São Paulo, dos 42 castigados, 11 voltarão a ser vereadores.
No Rio, 10 dos 32 cassados reassumirão suas vagas. Em Santa Catarina, 23 dos 71 vereadores que perderam o posto, estarão de volta em 2009. No Paraná, 80 dos 212 punidos conseguiram conquistar um novo mandato nas Câmaras Municipais. No Rio Grande do Sul, 29 dos 89 punidos também foram eleitos novamente.
Em várias cidades, alguns dos vereadores castigados pela infidelidade partidária não apenas recuperaram as vagas como ainda foram os campeões de votos em seus municípios. No município de Santa Inês, no Paraná, três vereadores que haviam sido cassados por infidelidade conseguiram se eleger outra vez.
O fenômeno acontece porque, ao impor a regra que pune a infidelidade partidária, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com o respaldo do Supremo Tribunal Federal (STF), previu apenas a retirada do mandato dos parlamentares que trocaram de partido sem justificativa convincente. Não incluiu na pena o castigo da inelegibilidade, que impediria que esses políticos voltassem a concorrer nas eleições seguintes.
ARTIFÍCIOS
No caso dos vereadores, o calendário eleitoral ajudou. Como já estavam no período final de seus mandatos, eles contaram com a morosidade da Justiça para realizar a análise de seus casos e com a ilimitada possibilidade de apresentação de recursos contestando as punições. Assim, até mesmo os punidos que não se reelegeram acabaram conservando seus mandatos por um tempo mais longo do que esperavam.
A situação abre mais uma polêmica nas divergências entre o Judiciário e o Legislativo na definição das regras para a fidelidade partidária. O conflito foi aberto ainda em 2007, quando o Judiciário decidiu pôr um freio no troca-troca partidário que ocorria constantemente dentro do Congresso e nas Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais.
A interpretação dada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi a de que o mandato pertence ao partido pelo qual o político foi eleito. Assim, em caso de mudança de legenda sem motivo justificado, o parlamentar perde a vaga, repassada automaticamente ao suplente, desde que esse também não tenha mudado de partido.
Somente serão consideradas legítimas as trocas feitas até 27 de março de 2007 ou se enquadrem nas quatro exceções que permitem nova filiação partidária. São elas: incorporação ou fusão de partido, criação de legenda, grave discriminação ou alteração na ideologia partidária.
Na semana passada, a questão da fidelidade partidária acabou reacendendo as discussões entre Judiciário e Legislativo. Ao analisar ações de inconstitucionalidade apresentadas pelo PSC e pela Procuradoria-Geral da República contestando a regra de fidelidade, o Supremo decidiu reconhecer a validade da norma estabelecida pelo TSE.
Os principais líderes partidários e o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), ficaram irritados com a decisão. Chinaglia, aliás, tem contestado a determinação do Judiciário de retirar o mandato do deputado Walter Britto Neto, que foi eleito pelo DEM, mas se filiou posteriormente ao PRB.
FILA
Na prática, o problema está apenas começando, porque é muito grande a fila de pedidos de cassação de mandato por infidelidade partidária acumulada para a análise dos TREs. No caso dos vereadores, centenas de parlamentares já foram punidos e muitos outros ainda aguardam julgamento. A mesma onda deve alcançar agora deputados estaduais e federais. Segundo dados do TSE, somados deputados estaduais e vereadores, existem ainda mais de 2 mil processos por infidelidade partidária em tramitação.