Título: Mais FGTS em saneamento
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Fonte: O Estado de São Paulo, 01/12/2008, Notas & Informações, p. A3

O Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) deverá analisar, em 2009, proposta de ampliação das verbas destinadas ao saneamento básico, revelou ao jornal Valor, quinta-feira, o representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no grupo de apoio do FGTS, André de Souza. Antes de ser submetida ao Conselho Curador, a proposta precisa ser analisada com rigor, pois os recursos do FGTS têm destinação específica e são a principal poupança de milhões de trabalhadores.

Com ativos da ordem de R$ 210 bilhões, patrimônio líquido de R$ 23 bilhões e cerca de R$ 70 bilhões em caixa ou aplicações de curto prazo, os recursos do FGTS excitam a gula de agentes públicos e setores econômicos. Em 2007, o FGTS foi autorizado a aplicar R$ 5 bilhões em fundos de infra-estrutura. Neste ano, propiciou a liberação de recursos adicionais de R$ 6 bilhões para o BNDES - cujas linhas de fomento o governo quer ampliar ainda mais. Agora, pretende-se permitir que R$ 10 bilhões do Fundo sejam aplicados na subscrição de ações de empresas de saneamento básico, sob a forma de participação em Sociedades de Propósito Específico (SPEs). Ou, então, em debêntures e cotas de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios das companhias.

As empresas de saneamento já estão habilitadas a tomar empréstimos do FGTS, mas a maioria não atende às exigências legais. Para que o Fundo possa fornecer-lhes capital, as regras terão de ser mudadas.

O objetivo da proposta é justificável: cerca de 100 milhões de pessoas sofrem com condições sanitárias precárias - apenas 46% dos brasileiros têm acesso a tratamento de esgoto, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A insuficiência dos investimentos em infra-estrutura tem custo social elevado e também para as empresas. Trabalhadores que vivem em áreas sem infra-estrutura adoecem mais, demandando atendimento em prontos-socorros e incorrendo no absenteísmo.

A Lei do Saneamento Básico, do ano passado, permitiu a criação de Parcerias Público-Privadas (PPPs) para atrair investimentos particulares para o setor. Foi uma forma de atenuar a escassez de verbas para o saneamento, mas as maiores companhias do setor ainda são estatais - e poucas bem administradas.

¿Essas empresas têm dificuldade de gestão, e o FGTS seria um parceiro para solucionar esse problema¿, declarou o superintendente do FGTS da Caixa Econômica Federal (CEF, gestora dos recursos do Fundo), Joaquim Lima. Admitido o problema da má administração das empresas, o que se pretende é que os investimentos do Fundo sejam acompanhados da imposição de regras de gestão.

¿Hoje já conseguimos o marco regulatório, já temos recursos disponíveis¿, assinalou o vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Base e Infra-Estrutura, Newton de Azevedo. ¿Está na hora de olharmos para a gestão das empresas e ver o que é possível fazer para efetivar os investimentos no setor.¿ Não parece razoável que o Fundo seja usado para o propósito de modernizar a gestão das companhias, pois não é esta a sua finalidade.

Há companhias de saneamento eficientes e lucrativas, como a Sabesp, de São Paulo, a Copasa, de Minas Gerais, e a Sanepar, do Paraná. Mas a segunda maior do setor, a Cedae, do Rio de Janeiro, teve um prejuízo líquido de R$ 378 milhões em 2007, correspondente a mais de 16% da sua receita líquida, o mesmo ocorrendo com a Saneago, de Goiás, a Caema, do Maranhão, a Consapa, do Pará, a Agespisa, do Piauí, a Casal, de Alagoas, a Caerd, de Rondônia, e a Caer, de Roraima. Em situação crítica estão a Cosama, do Amazonas, a Caesa, do Amapá, e o Deas, do Acre. A melhoria da gestão e a recuperação dessas empresas dependem da competência dos respectivos governadores, não da participação do FGTS no capital.

A obrigação do FGTS é gerir com cuidado e eficiência a poupança dos trabalhadores. Hoje, esta poupança é mal remunerada, com juros de 3% ao ano mais a Taxa Referencial de Juros. Mas os recursos do Fundo não devem ser destinados a aplicações de risco a pretexto de remunerá-la melhor.