Título: Índia só perde para Iraque em número de atentados
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Fonte: O Estado de São Paulo, 29/11/2008, Internacional, p. A18
Desde o início de 2004, o terrorismo matou mais pessoas na Índia do que em qualquer país do mundo, com exceção do Iraque, e não há nenhum indício de que a intensidade dos ataques vá diminuir, afirma Robert Broadfoot, da empresa Political & Economic Risk Consultancy, de Hong Kong.
¿Existem muitos grupos terroristas em ação na Índia e eles não são apenas islâmicos. Nós já esperávamos novos ataques¿, disse Broadfoot ao Estado por telefone. Além de radicais muçulmanos, há grupos hindus, maoístas e vários ligados a algumas das inúmeras etnias que habitam o país, como tâmil e sikh. A maioria tem demandas separatistas e pretende criar novos Estados dentro do território indiano.
O número de mortes em atentados no país desde 2004 passou de 4 mil. Só no ano passado, o terrorismo fez quase mil vítimas. Neste ano, 200 pessoas já haviam morrido em atentados a bomba lançados pela organização Mujahedin Indianos, que havia ameaçado promover novos ataques em Mumbai.
Ainda não se sabe se a organização é responsável pelos atentados recentes, mas está claro que eles foram cometidos por radicais islâmicos. A grande dúvida é saber se o grupo tem origem estritamente doméstica ou se possui conexões com organizações no exterior, como a Al-Qaeda ou o serviço de inteligência paquistanês, acusado pelo governo indiano de envolvimento.
A empresa de Broadfoot realiza análise para empresas estrangeiras dos riscos políticos e econômicos de 14 países asiáticos, que não incluem Paquistão e Afeganistão. Nas projeções para 2009, a Índia aparece como o país mais arriscado da região, principalmente por causa do terrorismo. Apesar disso, Broadfoot não espera que a economia indiana sofra de maneira significativa em conseqüência dos novos atentados. O peso do turismo no PIB é pequeno e as multinacionais não deixarão de investir em um país que tem 1,1 bilhão de habitantes, ressaltou.
Rory Medcalf, diretor do programa de segurança internacional do Lowy Institute for International Policy, da Austrália, afirma que o grau de organização e a audácia dos atentados indicam alguma forma de apoio externo aos terroristas.
¿Acredito que os atentados pretendem desestabilizar o governo, afetar a economia e influenciar as eleições gerais do próximo ano¿, declarou o ex-diplomata, que serviu no Alto Comissariado Australiano em Nova Délhi de 2000 a 2003. Para ele, outro possível efeito dos ataques é a polarização da sociedade indiana, com o fortalecimento da direita hinduísta em contraposição ao crescimento do radicalismo islâmico.
A Índia enfrenta o terrorismo desde o fim do regime colonial britânico, em 1947. Muitos dos grupos surgiram entre etnias minoritárias que se consideram preteridas pela maioria hindu, que representa 80% da população. Mas a principal fonte de confrontos é a região da Caxemira, disputada por Índia e Paquistão. A relação entre os dois países é central nos atentados que assolam a região. A divisão territorial de 1947, quando Paquistão e Índia surgiram como Estados independentes, alimenta até hoje a ação de extremistas muçulmanos, que proclamam legitimidade sobre partes do território indiano.
A enorme diversidade religiosa e étnica do país também contribui para a multiplicação de conflitos. Após os hindus, os muçulmanos são o maior grupo na população, com 13,4%. Em seguida, aparecem cristãos (2,3%), sikhs (1,9%), budistas (0,8%) e várias outras religiões com número menor de seguidores.