Título: Governo libera gastos de estatais
Autor: Gobetti, Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/11/2008, Economia & Negócios, p. B1
O governo começou a liberar as estatais da obrigação de acumular superávits primários para que impulsionem os investimentos do setor público. Entre outubro de 2007 e outubro deste ano, o valor anualizado da poupança das empresas federais caiu (incluindo pagamentos de Itaipu) de R$ 20 bilhões para R$ 6,5 bilhões, enquanto os investimentos - liderados pela Petrobrás, que já tomou emprestado mais de R$ 35 bilhões no ano - subiram de R$ 27,5 bilhões para R$ 37,6 bilhões.
O movimento, que vinha ocorrendo por conta do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), se intensificou em outubro, com o agravamento da crise internacional. Boa parte dessas estratégia de incrementar os investimentos das estatais deriva também do perfil do governo Lula: baixíssima capacidade de investir o dinheiro do Orçamento da União e altíssima disposição política para aumentar o custeio - só a conta da folha de salários (ativos e inativos), vai pular de R$ 120 bilhões, ano passado, para R$ 150 bilhões no ano ano que vem.
A liberação das metas fiscais é antiga reivindicação da cúpula das estatais e já chegou a ser sugerida até por economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI), uma vez que essas empresas não têm dívidas que justifiquem superávit tão elevado. Hoje, o dinheiro economizado pelas estatais fica no caixa, sem poder ser utilizado para investimentos.
Durante algum tempo, esses superávits foram usados para ajudar a cumprir as metas fiscais do setor público. As disponibilidades em caixa das estatais, estimadas em R$ 45 bilhões pelo Banco Central, integram os chamados créditos do setor público, que são descontados do valor bruto da dívida para se chegar à dívida líquida.
DÍVIDA PÚBLICA
Agora que a dívida pública caiu consideravelmente (para 36,6% do PIB no fim de outubro) e o governo cumpre com folga a meta de superávit, tornou-se desnecessário impor essa camisa-de-força às estatais. Sendo assim, estão autorizadas a tomar mais empréstimos.
Essas companhias contribuem diretamente com investimentos no País, que, até outubro, somavam R$ 37,6 bilhões em 12 meses. Também estão financiando indiretamente os investimentos da União, dos Estados e dos municípios, além de se ajudarem mutuamente, como no empréstimo de R$ 2 bilhões da Caixa à Petrobrás.
Entre novembro de 2007 e outubro deste ano, as empresas federais pagaram R$ 35,8 bilhões em dividendos e royalties. Desse valor, R$ 11,3 bilhões foram repassados aos Estados e municípios e R$ 24,5 bilhões ficaram com a União, cujo desembolso para investimentos somou no mesmo período R$ 27,8 bilhões. Ou seja, os dividendos e royalties das estatais financiaram implicitamente 88% das obras e projetos patrocinados pelo governo federal.
Somente a Petrobrás já tinha transferido, até agosto, R$ 7,3 bilhões de dividendos e R$ 14,3 bilhões de royalties para o Tesouro. Dos royalties, 55% foram para os Estados e municípios e o resto ficou com a União. Se considerarmos a conta de impostos pagos, a cifra é de mais R$ 48,5 bilhões até agosto - em outubro, segundo a própria Petrobrás, a empresa recolheu mais R$ 11,4 bilhões
METAS
Formalmente, as estatais continuam sujeitas às metas de superávit primário. O último relatório de programação financeira divulgado pelo Ministério do Planejamento, no dia 21 de novembro, estipula que a meta a ser cumprida neste ano continua em R$ 18,7 bilhões, dos quais R$ 12,7 bilhões cabem somente à Petrobrás. Na prática, entretanto, nenhum técnico acredita que seja possível atingir essas metas, dado o nível de despesas e dívidas que as estatais assumiram este ano.
Por uma questão de prudência, entretanto, o governo decidiu não oficializar a liberação das estatais dos compromissos fiscais, estipulados na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). No início do governo Lula, por exemplo, as empresas do governo foram fundamentais para garantir a elevação do superávit primário.
Com o agravamento da crise e seus efeitos sobre a arrecadação federal, não está descartado que, em 2009, o governo volte a exigir das suas empresas uma maior economia para eventualmente compensar um menor superávit do governo.