Título: Crueldade das mortes é recado das máfias
Autor: Booth, William
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/12/2008, Internacional, p. A11

Os esquadrões da morte dos cartéis da droga estão matando de formas espetacularmente macabras, usando a violência como linguagem para transmitir uma mensagem à sociedade. Os cadáveres mostram cada vez mais sinais de tortura e, muitas vezes, aparecem decapitados. Segundo especialistas, os cartéis procuram encenar a versão radical do método ¿chocar e apavorar¿ a fim de transmitir sua disposição de lutar até o fim. Para as autoridades, os cartéis estão matando de forma tão chocante para minar a confiança da população no governo.

Enquanto os cartéis e suas células lutam contra a polícia e o Exército e mesmo entre si pelo controle dos corredores de um contrabando que rende bilhões de dólares - cujo alvo é o mercado de drogas dos EUA -, a violência desencadeada pela guerra do presidente Felipe Calderón contra os traficantes se torna mais sensacional.

Calcula-se que tenham sido assassinadas 4.500 pessoas em atos de violência relacionados à droga desde 2007, quando Calderón deslocou para a fronteira e para outras zonas 20 mil soldados e milhares de agentes federais. Novembro foi o mês mais sangrento até o momento, com pelo menos 700 mortes. Algumas vítimas não tinham qualquer relação com o comércio da droga, diz a polícia.

Ontem, 17 pessoas foram assassinadas no Estado de Chihuahua - 6 na fronteiriça Ciudad Juárez. No Estado de Sinaloa, foram encontrados ao lado de um ônibus os corpos de 13 pessoas que tinham as mãos amarradas.

Jorge Luis Aguirre, fundador do site de notícias La Polaka, disse que os cartéis travam uma guerra de relações públicas mortal, mas eficiente. ¿Estão fazendo piada da autoridade do governo. Dizem que nenhum governo poderá detê-los e cometem estes assassinatos espetaculares¿, disse Aguirre. ¿Quem poderia deixar de prestar atenção nisso?¿

John P. Walters, diretor da agência de combate às drogas da Casa Branca, afirmou que Calderón e seus soldados estão desestabilizando os cartéis, prendendo e extraditando seus líderes, semeando o caos entre suas fileiras, e esta é uma das razões pelas quais a violência chegou a tais extremos. ¿O terror é uma prova de fraqueza.¿

No passado, muitos chefes do narcotráfico procuravam ser descritos como uma espécie de ¿Robin Hood¿ durões, que davam de presente bolas de futebol para crianças e pagavam a cerveja e as orquestras para alegrar as festas no interior. Agora, os cartéis e seus matadores, freqüentemente ex-policiais, estão se apresentando como mercadores do caos e da morte.

Segundo as polícias do México e dos EUA, o espasmo de violência é uma decorrência de uma sobreposição de conflitos. Os cartéis e as células que os compõem brigam entre si e fazem acordos com traidores na organização e com concorrentes fora dela, que em muitos casos são policiais corruptos a soldo dos cartéis.

¿É um jogo de xadrez tridimensional¿, comentou Bruce Bagley, especialista em narcotráfico e professor da Universidade de Miami. ¿Quando o comércio da droga espantosamente lucrativo alimenta esta brutalidade, isso atende a múltiplas funções - vingança, transmissão de mensagens, apavorar o público e, evidentemente, ganhar. Não devemos esquecer de que estes sujeitos farão qualquer coisa para ganhar.¿

AJUDA AMERICANA

Colômbia - Recebeu mais de US$ 6 bilhões desde 2000, sob o Plano Colômbia, para o combate ao tráfico de drogas e rebeldes de esquerda

México - Receberá US$ 1,4 bilhão, por meio da chamada Iniciativa Mérida, ao longo de três anos. Este ano, receberá US$ 400 milhões

Bolívia - Os EUA financiam os trabalhos antidrogas bolivianos com US$ 35 milhões ao ano

Peru - Segundo maior produtor de cocaína, após a Colômbia. O governo peruano recebeu US$ 54 milhões dos EUA em 2006, quando produziu 290 toneladas de cocaína