Título: Desmonte da reforma
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/12/2008, Notas & Informações, p. A3

Além de mostrar pouco interesse em barrar o avanço, no Congresso, dos projetos do senador Paulo Paim (PT-RS) que revogam parcialmente a reforma previdenciária aprovada nos últimos anos e aumentam o rombo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o governo acabou reconhecendo que eram apenas retóricas suas críticas a esses projetos. Ao abrir negociações com dirigentes das centrais sindicais para extinguir o fator previdenciário, como prevê projeto de Paim já aprovado no Senado e que tramita na Câmara dos Deputados, dá a mais clara demonstração de que sua resistência a mudanças no sistema previdenciário não passava de encenação.

O que o ministro da Previdência, José Pimentel, está sugerindo para substituir o fator previdenciário é a adoção no setor privado do sistema que vigora no setor público, conhecido como Fator 95. De acordo com esse sistema, só tem direito à aposentadoria correspondente a 100% da média das contribuições o trabalhador cuja idade somada ao tempo de contribuição totalize 95 (para as mulheres, o fator é 85). Os dirigentes sindicais disseram-se inconformados com a proposta. Querem simplesmente o fim do fator previdenciário, sem mudança nas regras atuais para a idade mínima de aposentadoria.

Já aprovado pelo Senado, avança na Câmara sem problemas o projeto de Paim que extingue o fator previdenciário. Em outubro, recebeu parecer favorável da Comissão de Seguridade Social e Família. Há pouco, a Comissão de Finanças e Tributação designou o relator da matéria, o deputado Pepe Vargas (PT-RS), do mesmo partido e do mesmo Estado do senador Paim. Agora que o governo iniciou as negociações do fim do fator previdenciário, deve avançar ainda mais depressa.

O fator previdenciário foi criado para desestimular a aposentadoria precoce e leva em conta a alíquota de contribuição, a idade do trabalhador, o tempo de contribuição e a expectativa de vida do brasileiro. De acordo com estatísticas do INSS, desde que entrou em vigor, há oito anos, o fator permitiu o aumento de 48 para 53 anos da idade média dos trabalhadores que pedem aposentadoria, o que continua sendo um recorde mundial de aposentadoria precoce. Apesar disso, estima-se que, até agora, o fator permitiu ao INSS uma economia de R$ 10 bilhões.

Não é apenas nessa questão que o governo vem cooperando para as vitórias parlamentares do senador Paulo Paim. Há cerca de três semanas, quando a Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado aprovou o seu projeto que recompõe o poder aquisitivo dos aposentados na época em que os benefícios foram concedidos, em caráter terminativo - isto é, sem a necessidade de votação pelo plenário, caso não haja recurso de pelo menos 10% do senadores contra a decisão -, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), e a líder da bancada do PT, Ideli Salvatti (SC), anunciaram que recorreriam ao plenário. O prazo para a apresentação do recurso terminou sem que os líderes tocassem novamente no assunto. O projeto já está na Câmara. Segundo projeções do INSS, se entrar em vigor, essa medida fará seu déficit crescer de 7,4% do PIB para 26% em 2049.

Também de Paim é o projeto que estende para todos os benefícios previdenciários a aplicação do índice de correção do salário mínimo. Neste ano, o mínimo foi corrigido em 9,2%, enquanto aos benefícios de valor superior a um salário mínimo foi aplicada a correção de 5%, correspondente à variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) calculado pelo IBGE. Aprovado pelo Senado, esse projeto aguarda votação na Câmara.

O ministro Pimentel chegou a fazer apelos aos congressistas invocando a necessidade de agir com responsabilidade nas mudanças do sistema previdenciário. Agora, negocia as mudanças que dizia combater.

Até há pouco, era possível esperar - com uma boa dose de otimismo - que, devidamente orientada por suas lideranças, a maioria governista na Câmara, proporcionalmente mais forte do que a do Senado, barrasse esses projetos que criam despesas sem definir as receitas - uma maneira segura de ampliar o rombo da Previdência Social. Mas, com a decisão do governo de negociar com as centrais, não se deve esperar qualquer resistência dos deputados governistas, já naturalmente pouco dispostos a enfrentar as pressões de aposentados e pensionistas - que, afinal, são eleitores.