Título: Quito busca apoio para dar calote no BNDES
Autor: Costas, Ruth
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/12/2008, Internacional, p. A12

O Equador qualificou ontem de ¿lamentáveis¿ e resultado de ¿uma prática política condenável¿ as declarações do chanceler brasileiro, Celso Amorim, sobre a decisão de Quito de levar à arbitragem internacional uma dívida com o BNDES. Amorim disse que a medida foi ¿um tiro no pé¿ porque o Brasil seria uma das poucas fontes de crédito dos equatorianos.

¿Nosso Estado é soberano e tem o direito de ir a arbitragens quando considerar que um contrato afeta seu interesse nacional¿, disse o ministro de Segurança equatoriano, Gustavo Larrea. ¿Se um país condiciona suas fontes de financiamento a que o Equador não tenha direito de exigir seus interesses, não nos interessa. Essa é uma prática política condenável.¿

Quito não quer pagar 30% de sua dívida externa de US$ 10 bilhões. Desse montante, US$ 242,9 milhões correspondem a recursos emprestados pelo BNDES para financiar obras da Odebrecht. Quito começou na terça-feira uma campanha internacional para conseguir apoio. Seus enviados já estão na Argentina e no Chile e devem viajar para os EUA e o Peru.

Outros governos, como o do venezuelano Hugo Chávez, já manifestaram sua solidariedade a Quito. ¿Esse é um caso típico de colonialismo econômico¿, disse Chávez num encontro com líderes da região em novembro, quando foi anunciado que Venezuela e Bolívia também poderiam ¿auditar¿ suas dívidas.

O Brasil endureceu o tom. Chamou de volta seu embaixador em Quito e ameaçou não financiar mais obras de infra-estrutura em países que seguissem o caminho equatoriano. A polêmica, porém, já havia lançado o País no que parece ser uma nova e delicada fase das relações com os países vizinhos.

O Paraguai agora quer o ¿perdão¿ de US$ 19 bilhões referentes às obras da hidrelétrica binacional de Itaipu. E Caracas deu uma resposta vaga a uma consulta do Itamaraty sobre se a ¿auditoria¿ da sua dívida poderia atingir interesses brasileiros.

¿Tais contestações de dívida são sobretudo uma resposta ao público interno, a movimentos sociais que ajudaram a eleger os presidentes desses países¿, disse ao Estado Tullo Vigevani, coordenador do mestrado em Relações Internacionais vinculado à Unesp, Unicamp e PUC. O calote é aprovado por 60% dos equatorianos. Chama a atenção o fato de a expulsão da Odebrecht ter sido anunciada às vésperas do referendo constitucional e de o Equador estar se preparando para eleições gerais em abril.

Marcelo Coutinho, coordenador do Observatório Político Sul-Americano da Universidade Cândido Mendes, no Rio, diz que um calote levaria a economia equatoriana ao colapso, secando as fontes de crédito num momento de queda do petróleo, das remessas de imigrantes e dos investimentos internacionais. ¿O Brasil ainda tem espaço para negociar¿, diz Coutinho. ¿Mas é claro que se o Equador e outros países insistirem em contestar suas dívidas haverá um grande retrocesso nos projetos de integração da região.¿

RELAÇÕES COMPLICADAS

Equador: O governo equatoriano expulsou a construtora brasileira Norberto Odebrecht e está contestando sua dívida com o BNDES

Paraguai: Quer o perdão da dívida de US$ 19 bilhões referente à construção da hidrelétrica binacional de Itaipu

Venezuela: Chávez anunciou que também pretende auditar sua dívida externa e Caracas deu uma resposta vaga a uma consulta do Itamaraty sobre se isso poderia afetar interesses brasileiros

Bolívia: Também deve ¿auditar¿ sua dívida. Em 2006, já ocupou militarmente instalações da Petrobrás para pressionar por uma revisão de contratos