Título: Prever alagamentos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/12/2008, Notas e Informações, p. A3

Sobre o fato de em duas horas, nessa segunda-feira, ter caído um terço das chuvas do mês, na maior precipitação do ano na capital paulista, e que resultou em enormes transtornos para a cidade, é preciso registrar, já de início, a nota mais importante e mais feliz: não ter havido vítimas fatais. Apesar dos 45 pontos de alagamento - 37 deles intransitáveis -, dos congestionamentos de 174 quilômetros, de trechos de avenidas importantes como Ibirapuera, Santo Amaro, 23 de Maio, Interlagos, além das Marginais do Tietê e do Pinheiros, ficarem inteiramente intransitáveis; de pessoas ficarem ilhadas em suas casas; de crianças e idosos terem de ser resgatados pelos bombeiros; de muitas árvores (pelo menos 15) terem caído; de pessoas terem sido arrastadas por enxurradas, o esforço de salvamento e a solidariedade evitaram que em São Paulo ocorresse uma tragédia.

Mas é preciso insistir em que, dada a impermeabilização do solo da capital paulista, irreversível e irremediável - pois não é possível recuperar a porosidade do solo como nos tempos do chão de terra e do paralelepípedo -, o fundamental tem que ser a desobstrução dos canais de vazão: bueiros e córregos canalizados, os sistemas de depósito de excedente de água, do tipo ¿piscinões¿, e o desassoreamento (e/ou rebaixamento de calhas) dos dois principais rios da capital. Em certa medida, a razoável rapidez com que as águas se escoaram, a despeito do extraordinário volume, mostrou os resultados positivos do que se tem feito em termos de saneamento básico e limpeza pública na capital.

O fundamental, agora, parece ser sem dúvida o trabalho nos principais pontos de alagamento, claramente demarcados por esta enchente, a partir dos quais se pode encetar obras públicas que contribuam para eliminá-los - ou reduzir seus efeitos - tanto quanto as mobilizações de socorro em situações de emergência.

Em precipitações pluviométricas de grande intensidade os desabamentos são o maior perigo, especialmente de moradias construídas ou instaladas em áreas de risco. Nisto São Paulo teve muita sorte desta vez. A Defesa Civil tem plano para retirar moradores de áreas de alto risco de desabamento quando chover 60 milímetros por três dias consecutivos numa mesma região da cidade. É o alerta máximo para se colocar em prática o plano emergencial de evacuação. No entanto, o mapa de riscos, com áreas sujeitas a enchentes ou desabamentos, em períodos de chuvas na capital, é de 2003 - portanto, é preciso atualizá-lo.

Pelo levantamento feito pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) cerca de 5.500 famílias moram em 562 pontos de risco, em encostas e margens de córregos. Desse total, 315 pontos são considerados de muito alto e alto riscos. Nas áreas mais perigosas há cerca de 11.500 moradias, onde habitam 57.500 pessoas. Considerando-se, porém, que os locais de risco com o correr do tempo vão se tornando ainda mais arriscados, é preciso que se faça, a respeito, uma rigorosa atualização de dados.

Segundo o coordenador de áreas de risco da Secretaria das Subprefeituras, Marcel Sanches, a Secretaria estima que metade dos 562 pontos de risco foi eliminada nos últimos quatro anos porque a administração municipal investiu R$ 28,5 milhões em intervenções, realizando - até 31 de outubro - 57 obras, das 108 previstas, beneficiando 6.200 famílias. Seria importante, no entanto, a Secretaria dar pormenores sobre a situação dos pontos de risco que continuam perigosos. Em se tratando de segurança para vidas humanas, a informação precisa é absolutamente essencial.

Disse o secretário municipal de Transportes, Alexandre de Moraes, que na própria segunda-feira foram mapeados 43 pontos de alagamento da capital paulista e que já no dia seguinte a Prefeitura realizaria ações preventivas nesses locais. Por sua vez, o prefeito Gilberto Kassab afirmou que ¿São Paulo pode esperar uma presença firme da Prefeitura para evitar transtornos¿.

É claro que é isso que a população de São Paulo espera tanto da Prefeitura quanto do Estado, na parte que cabe a este.