Título: Líder morre e militares tentam golpe na Guiné
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Fonte: O Estado de São Paulo, 24/12/2008, Internacional, p. A9

Capitão anuncia tomada de poder e suspensão da Carta; governo nega.

AP E AFP

Aproveitando-se do vazio de poder que se seguiu ao anúncio da morte do presidente Lansana Conté, na segunda-feira à noite, oficiais do Exército da Guiné anunciaram ontem que tinham tomado o poder, dissolvido o governo e suspendido a Constituição no país africano.

No entanto, horas depois, o presidente da Assembléia Nacional, Aboubacar Sompare - a quem caberia legalmente assumir o poder -, negou que país tivesse sofrido um golpe militar e qualificou os líderes do movimento golpista de ¿um pequeno grupo de amotinados¿. ¿Não acredito que todo o Exército esteja por trás dessa rebelião¿, afirmou Sompare.

Em entrevista a uma emissora de TV francesa, o comandante do Exército da Guiné, general Diarra Camara, assegurou que o comando do Exército não estava participando de um golpe e o poder seria transferido, de acordo com a Constituição, a Sompare. Ainda segundo Camara, nenhuma autoridade do governo Conté estava presa.

Mesmo assim, até a noite de ontem, diplomatas ocidentais não sabiam dizer ao certo quem estava governando o país.

Em meio à situação confusa, testemunhas relataram um movimento abaixo do normal nas ruas da capital, Conakry. De acordo com essas mesmas fontes, a presença militar na cidade não era ostensiva. ¿Não vi nenhuma criança de uniforme escolar nem nenhuma das mulheres que, a esta hora, deveriam estar no mercado do centro¿, declarou um jornalista da rede de rádio e TV britânica BBC que vive na capital.

O anúncio do golpe foi feito pelo capitão do Exército Moussa Dadis Camara (cujo parentesco com o comandante da força não está claro). Por meio da rádio estatal, ele afirmou que as instituições vigentes do Estado mostraram-se ¿incapazes de resolver as crises que o país vem enfrentando¿.

¿A partir de hoje, a Constituição fica suspensa, assim como as atividades políticas e sindicais¿, disse ele. ¿O governo e as instituições da república foram dissolvidos.¿ De acordo com Camara, seria criado um ¿conselho consultivo¿ formado por líderes civis e militares para assumir o governo.

Ex-colônia francesa, a Guiné tem enfrentado nos últimos anos uma série de distúrbios e protestos contra o governo de Conté, que governava com mão-de-ferro desde 1984. Rica em recursos minerais e principal produtor de bauxita do planeta, a Guiné tem a maioria de seus 9,8 milhões de habitantes em situação de pobreza extrema.

Ao anunciar o golpe, Moussa Camara afirmou que a junta militar daria prioridade ao desenvolvimento econômico, combateria a corrupção, acrescentando que o futuro governo seria ¿mais equilibrado etnicamente¿. A população da Guiné é formada pelas etnias peuhl (40%), malinke (30%) e sussu (20%) - além de grupos étnicos menores. Quase 90% dos guineanos são muçulmanos.

Conté era sussu e tinha 74 anos. A causa da morte não ficou clara no ato do anúncio oficial, feito pelo primeiro-ministro Ahmed Souare, em rede nacional de TV - no qual pediu calma à população e declarou 40 dias de luto nacional. Sabe-se que Conté era diabético e fumante inveterado.