Título: Conflito na região esquenta 'guerra de propaganda
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/01/2009, Internacional, p. A8

Embaixada israelense divulga vídeos de supostas `crianças do Hamas¿

Denise Chrispim Marin, BRASÍLIA

Diante das críticas ao ataque à Faixa de Gaza, que resultou na morte de 763 palestinos em 13 dias, Israel intensificou esta semana uma campanha na mídia internacional para justificar sua estratégia no conflito. Nos últimos dois dias, a embaixada israelense em Brasília divulgou oito vídeos à imprensa por orientação do Exército de Israel. Alguns deles, como o ¿Crianças do Hamas¿, deram margem a conclusões negativas sobre Israel - que a própria diplomacia de Tel-Aviv apressou-se a dissipar.

O vídeo, um dos oito apresentados pela representação diplomática, mostra uma sequência de imagens de uma sala de aula, com crianças supostamente sendo treinadas para ações militares pelo Hamas, e fotografias de garotos vestidos como homens-bomba. Com uniforme militar, um menino afirma que pretende se tornar mártir. Seu objetivo seria ¿matar os judeus¿ porque são ¿animais¿. A entrevista teria sido concedida a uma rede de televisão palestina, conforme informou o vídeo.

O conselheiro Rafael Singer, da embaixada de Israel, sustentou que a divulgação desse vídeo teve o objetivo de alertar para a maneira como o Hamas se vale de crianças para atingir seus objetivos.

Não seria, como pareceu em um primeiro momento, uma justificativa à morte de mais de 220 crianças palestinas desde o início dos ataques israelenses à Faixa de Gaza. Diferentemente dos outros sete vídeos, o ¿Crianças do Hamas¿ havia sido enviado de Tel-Aviv a Brasília em maio do ano passado.

¿Lamentamos a morte dessas crianças. Mas quisemos, com esse vídeo, advertir para o fato de que muitas delas vêm sendo usadas pelo Hamas, que pretende formar gerações e gerações de terroristas¿, afirmou Singer. Na história dos conflitos entre Israel e palestinos, esse não é o primeiro caso de adoção de uma estratégia de propaganda questionável.

Em setembro de 2000, nos primeiros dias da segunda intifada (levante palestino), a imagem da morte pelas forças israelenses do garoto palestino Mohammed al-Durra, de 12 anos, abraçado ao seu pai, causou furor em todo o mundo. O garoto rapidamente virou símbolo da luta palestina contra Israel.

Em 2004, entretanto, o jornal francês Le Figaro levantou suspeitas sobre a veracidade da filmagem. Finalmente, em maio de 2008, foi descoberta a trapaça - as imagens haviam sido forjadas por uma rede francesa de televisão.

Outros três vídeos divulgados pela embaixada israelense mostram cenas que, do ponto de vista de Israel, comprovam a mobilização de civis, especialmente de crianças, para a defesa de supostos arsenais do Hamas em prédios públicos e residências.

Em um vídeo gravado em outubro de 2007 e divulgado após o ataque de terça-feira a escolas da ONU, Israel claramente tentou dar substância à tese de que escolas, prédios públicos e residências da Faixa de Gaza têm sido usados pelo Hamas para o lançamento de foguetes. A gravação mostra três supostos militantes disparando projéteis da escola de ensino fundamental Beit Hanoun, mantida pela ONU. As imagens teriam sido feitas de um avião militar de Israel.

Na última terça-feira, no campo de refugiados de Jabaliya, 43 palestinos foram mortos em decorrência de ataques das forças israelenses a duas escolas administradas pela ONU. A embaixada de Israel insiste que, entre essas vítimas, não havia crianças - apenas militantes do Hamas.