Título: A ameaça do desemprego
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/12/2008, Notas & Informações, p. A3

Nenhum empresário tem motivo para demitir, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, reagindo aos primeiros cortes de pessoal em grandes empresas, como a Vale do Rio Doce. Seu aborrecimento pode ser genuíno, mas crise econômica e desemprego não se combatem com retórica. Os efeitos da crise apenas começam a aparecer no mercado brasileiro de trabalho. Em novembro, o desemprego nas seis maiores áreas metropolitanas do País, 7,6%, foi o menor para o mês desde o início, em 2002, da nova série calculada pelo IBGE. A variação foi praticamente desprezível em relação ao nível de outubro, 7,5%, e o indicador foi bem melhor que o de novembro do ano passado, 8,2%. Isso significa que não há motivo para preocupação? Se os dados se esgotassem nesses números, ninguém teria motivo para perder o sono e o presidente poderia festejar o Natal tranqüilamente. Mas, embora o quadro geral seja muito melhor que na maior parte das grandes economias, convém levar em conta alguns indícios negativos.

Pelos dados do IBGE, o nível de ocupação diminuiu 0,4% nas seis áreas cobertas pela pesquisa. Esse indicador mede a proporção entre o número de pessoas ocupadas e a população em idade ativa (no Brasil, indivíduos com 10 anos ou mais). A variação pode parecer pouco importante, exceto por um detalhe: desde o início da série, a taxa de ocupação nunca havia baixado de outubro para novembro. Um segundo sinal inquietante captado na pesquisa foi a redução de 0,6% no contingente empregado no comércio - outro fato inesperado nesta época do ano.

Essas variações são ainda pequenas e pouco perceptíveis no quadro geral, porque os efeitos de uma longa prosperidade ainda não se esgotaram na economia brasileira. Em novembro, o número de pessoas ocupadas, 22,1 milhões, era 2,9% maior que o de um ano antes, nas seis maiores áreas metropolitanas. Essa diferença correspondia a um aumento de 611 mil postos de trabalho. O rendimento médio real, R$ 1.273,60, era 4% maior que o de novembro de 2007, descontada a inflação. Apesar dos primeiros impactos da crise, o consumo ainda se manteve bastante vigoroso nos últimos meses e isso não é surpreendente. Mas os empresários do setor já começam a reagir aos sinais de enfraquecimento da economia.

No mês passado, o setor industrial paulista fechou 34 mil postos de trabalho, segundo informou na terça-feira a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Os maiores cortes, em termos porcentuais, ocorreram nos setores de couros e artefatos, borracha e plástico, produtos de metal, alimentos e bebidas, veículos automotores, têxteis e máquinas e equipamentos. Os problemas do setor automobilístico foram noticiados mais amplamente que os de outras indústrias, e isso é compreensível, mas os dados da Fiesp dão uma visão mais clara do alastramento da crise, como comentou o diretor do Departamento de Estudos Econômicos da entidade, Paulo Francini. Segundo ele, a indústria paulista ainda poderá encerrar o ano com 40 mil empregados a mais do que em 2007, mas o quadro nos próximos meses poderá ser menos benigno.

Os problemas de emprego, portanto, apenas começam a surgir, e este é o lado positivo das últimas informações. Em vez de simplesmente condenar quem fecha postos de trabalho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deveria ampliar e aprofundar as medidas contra a recessão e o desemprego. Não adianta prometer mais investimentos públicos e anunciar até um novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), quando o governo não consegue realizar a maior parte dos projetos já orçados - e não por falta de recursos, porque tem sobrado dinheiro.

O Brasil não precisa de um novo PAC, mas da execução daquele já definido. O presidente Lula ganharia um tempo muito valioso, se cobrasse um balanço honesto do andamento dos vários projetos (a cargo do governo e das empresas), um levantamento dos entraves e uma seleção dos investimentos mais exeqüíveis a curto prazo.

Os últimos incentivos anunciados pelo governo podem ser úteis, mas ainda não mostram um roteiro bem definido de enfrentamento da crise. Não bastam, portanto, para robustecer a confiança dos empresários e dos consumidores. Este é o momento de mostrar liderança - até nas discussões sobre a adaptação das normas trabalhistas à proteção do emprego.