Título: Baixo estoque de vacinas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 25/01/2009, Notas & Informações, p. A3

O Brasil está com 10 milhões de doses do concentrado viral usado na produção de vacinas contra a febre amarela, quando o recomendado é um estoque de 40 milhões de doses. Somente no final do ano deverá ser restabelecido o estoque normal, mas, segundo Akira Homma, diretor do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), que produz o medicamento, para o atendimento mês a mês a produção é suficiente, uma vez que se suspendeu a exportação.

A queda no estoque resultou, de um lado, do aumento no número de ocorrências da doença no primeiro semestre de 2008, com elevação significativa da procura pela vacina, e, de outro, da contaminação dos ovos utilizados na sua produção, o que obrigou à procura por fornecedores no mercado internacional e à importação - processo lento devido à burocracia e aos entraves alfandegários. "Parece que no ano passado havia um urubu rondando por aqui, foi um ano cheio de problemas", comentou o diretor do Bio-Manguinhos.

O que havia, na verdade, era uma falha na política de compras do Instituto. Não se entende que uma entidade reconhecida internacionalmente como fabricante da vacina, com capacidade para produzir mensalmente entre 4 milhões e 5 milhões de doses da suspensão viral, contasse com apenas um fornecedor da matéria-prima. Só depois da queda do estoque é que a direção do Bio-Manguinhos optou por ampliar a rede de fornecedores de ovos.

Entre dezembro de 2007 e julho de 2008, o vírus voltou a atacar com relativa força. Houve 45 casos de febre amarela, com 25 óbitos. Por isso, o Ministério da Saúde recomendou que se estendesse a área de vacinação para os Estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. Todas as vítimas foram infectadas em áreas de mata. Desde 1942 não há casos de febre amarela contraída em áreas urbanas, mas o risco de reurbanização da doença não é descartável.

Além disso, o crescente trânsito de pessoas por áreas endêmicas estimula a discussão sobre a necessidade de colocar a vacinação contra febre amarela no calendário nacional de imunização infantil. Hoje, já é rotina para crianças, a partir de 9 meses de idade, em 11 Estados brasileiros - Amapá, Tocantins, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima, Acre, Pará, Goiás e Distrito Federal, onde a doença é endêmica - e em alguns municípios que apresentam risco potencial.

Os defensores da imunização de crianças em todo o País dizem que isso evitaria a exposição das pessoas à febre amarela até a idade adulta, assim como a necessidade de grandes campanhas de massa em momentos em que a incidência se agrava - uma das causas da rápida queda dos estoques no Instituto Bio-Manguinhos e do aumento do risco de aplicação inadequada do medicamento. A proposta de incluir a vacinação contra febre amarela no calendário nacional será discutida pelo comitê assessor de imunizações do Ministério da Saúde e no conselho dos secretários estaduais de Saúde.

Alguns especialistas acreditam que não haveria justificativa para submeter todas as crianças brasileiras ao risco de reações adversas à imunização, que são muito raras. Mas há quem lembre que grande parte do País pratica a vacinação em massa de crianças de 9 meses de idade sem problemas. As ocorrências adversas são, na maior parte, registradas em épocas de vacinação em massa, durante surtos da doença, isso porque não há tempo para que os aplicadores recebam orientação adequada e perguntem aos interessados na vacinação se são portadores de algo que a contraindique. Pessoas com problemas no sistema imunológico, por exemplo, não podem se vacinar.

Ainda que essa discussão se prolongue, e que não haja aumento da demanda pela vacina, é fundamental que os estoques sejam restabelecidos e a produção esteja garantida. A febre amarela silvestre não pode ser erradicada, pois o vírus vive nas matas, entre macacos e outros vetores que transmitem a doença. É fundamental, portanto, informar a população sobre a necessidade de se imunizar, principalmente porque é crescente, especialmente entre jovens, a procura de lazer em áreas de mata.