Título: A vitória parcial de Obama
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Fonte: O Estado de São Paulo, 11/02/2009, Notas & Informações, p. A3

O presidente Barack Obama obteve ontem uma vitória importante, mas parcial, em sua luta para tirar da recessão a maior economia do mundo. O Senado aprovou um pacote de estímulo econômico de US$ 838 bilhões, com US$ 19 bilhões a mais que o plano aprovado há duas semanas pela Câmara de Representantes. Ainda seria preciso conciliar as duas versões do plano anticrise para se produzir um texto legal com a chancela do Congresso. Mas o estímulo à atividade, por meio de investimentos, cortes de impostos, ajuda a pobres e desempregados e desenvolvimento de programas energéticos, de infraestrutura e sociais, é apenas parte da resposta a um problema extremamente complexo. Na melhor hipótese, o pacote fiscal terá sido bem projetado e as condições mínimas para seu sucesso terão sido cumpridas nesta fase. O êxito em sua aplicação, no entanto, vai depender de uma condição preliminar: antes de mais nada, é preciso juntar os cacos do sistema financeiro e fazê-lo funcionar novamente, emprestando para o consumo e a produção. As medidas de estímulo à recuperação econômica perderão parte de sua eficácia, se o setor bancário continuar encrencado.

Essa condição foi percebida na maior parte dos grandes países da Europa Ocidental e na Rússia. Daí a ênfase dos governos desses países na reparação do sistema bancário. Nos Estados Unidos, no entanto, o plano de arrumação do setor financeiro, apresentado ontem pelo secretário do Tesouro, Timothy Geithner, não chegou a animar o mercado. As bolsas despencaram logo depois do anúncio, porque faltou, segundo operadores entrevistados, explicar com detalhes como será a execução das medidas. Os números são astronômicos e, de acordo com o secretário, "a resposta política tem de ser ampla e poderosa", porque "há mais risco e maior custo no gradualismo do que em uma ação agressiva". São palavras sensatas, mas o mero anúncio das linhas de ação prometidas por Geithner parece ser ficado abaixo das expectativas.

A recuperação do setor financeiro é, portanto, uma das duas frentes principais da política anticrise. Nenhuma ação será produtiva - esta é uma das poucas certezas - enquanto os balanços do setor bancário não forem saneados, com a eliminação dos créditos podres, e não se restabelecer a confiança do público nos bancos e entre os bancos. Tudo isso é parte do plano resumido por Timothy Geithner, mas a mensagem ficou incompleta. Faltou, entre outros pontos, um cronograma de ação, como reconheceu, numa entrevista, o secretário.

Quanto ao plano de estímulos fiscais, a vitória no Congresso é só o começo de um longo e complexo trabalho, sujeito a erros e revisões. O governo mostrará sua competência se for capaz de avaliar a própria ação e de promover os ajustes necessários. Há quem considere insuficiente um pacote pouco superior a US$ 800 bilhões. Se essa opinião for correta, o governo terá de ampliar o orçamento anticrise, aumentando o déficit público e, mais adiante, o custo de rolagem da dívida federal, com reflexos nas condições internacionais de financiamento.

Por enquanto, cabe reconhecer o êxito do presidente Obama em seu esforço para conseguir a aprovação do pacote. Na véspera da votação no Senado, ele fez um discurso dramático em Elkhart (Indiana). Nessa cidade o desemprego passou de 4,7% em dezembro de 2007 para 15,3% em dezembro de 2008. O presidente soube escolher o tópico mais dramático para falar em defesa de seu plano. "Se ninguém acredita que esta é uma crise total, sugiro que pergunte aos milhões de americanos cuja vida foi virada de pernas para o ar porque não sabem de onde virá seu próximo cheque de pagamento (...) Por isso a coisa mais importante deste plano é manter ou criar 4 milhões de empregos", diria ele, à noite, em sua primeira entrevista coletiva. O objetivo do pacote não é algo abstrato ou impessoal, mas a recuperação da segurança das famílias. Se o plano funcionar, será esse o resultado mais importante.

Obviamente, como disse Obama, só a ação do poder público pode levar a uma superação ordenada e eficiente da recessão. Não se trata apenas do volume de dinheiro mobilizável pelo Estado, mas principalmente de sua capacidade de romper o ciclo vicioso criado pelas ações defensivas de cada agente isolado. Isso ocorre tanto na recessão quanto na inflação e não tem nenhuma relação com políticas estatizantes.