Título: Brasileira confessou farsa, diz jornal suíço
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/02/2009, Internacional, p. A18

Segundo ""Weltwoche"", ela admitiu fraude e estaria buscando indenização

Jamil Chade

O jornal suíço Weltwoche revelou ontem que a pernambucana Paula Oliveira, que disse ter sido agredida por skinheads nos arredores de Zurique e abortado, já teria confessado à polícia local que o suposto ataque não passou de uma farsa e ela nunca esteve grávida. A rede de TV Telezurich reiterou a história. Ainda segundo a imprensa, ela teria assinado uma confissão. De acordo com o jornal, a polícia especula que o objetivo de Paula seria processar o Estado por causa da agressão para obter uma indenização que poderia chegar a R$ 200 mil.

Ontem, o Ministério Público suíço anunciou a abertura de um processo penal contra Paula, que está impedida de sair do país - seu passaporte foi retido. A brasileira terá agora de prestar depoimento e corre o risco de pegar até 3 anos de prisão por falso testemunho.

A Justiça optou por não se pronunciar sobre a revelação do jornal. Sem desmentir a notícia, o advogado de defesa de Paula, Roger Muller, alertou que a confissão só terá valor perante a Justiça. O Itamaraty diz desconhecer as revelações da imprensa suíça.

A brasileira disse ter abortado gêmeos após ser atacada por três neonazistas na semana passada, na estação de trem de Dubendorf. Ela teve seu corpo marcado com estilete com as letras do partido de extrema direita SVP (Partido do Povo Suíço). Mas o laudo médico concluiu que Paula não estava grávida no momento da suposta agressão.

Segundo o Weltwoche, Paula foi pressionada pela polícia e pelos médicos-legistas e acabou confessando a farsa ainda na sexta-feira - dia da divulgação do primeiro laudo pericial. Ela teria planejado o ato, comprado uma faca de cozinha na popular loja de departamentos Ikea, e levado ao trabalho na segunda-feira da semana passada. Na volta, teria entrado no banheiro da estação de Dubendorf e se cortado, simulando o ataque.

Paula teria tentado convencer a polícia de que fez testes de gravidez com material de supermercado e até um ultrassom, mas as fotos teriam sumido. O telefone da médica também teria desaparecido.

Pressionada, Paula chorou e confessou que a gravidez e o ataque dos neonazistas eram uma armação. Sobre as letras do partido em seu corpo, ela disse que apenas conhecida o SVP dos cartazes espalhados pela Suíça.Questionada sobre os motivos, disse: "Pergunte a um psiquiatra." Segundo a imprensa, Paula teria afirmado que fez tudo sozinha, sem a ajuda de seu namorado, o suíço Marco Trepp.

O histórico de Paula ainda incluiria outra notícia falsa. A de que teria sido casada no passado com um homem chamado François, supostamente morto em um acidente de avião da TAM.

SAÍDA DA SUÍÇA

Segundo o Estado apurou, o Ministério Público suíço, até ontem de manhã, estava disposto a aceitar que ela deixasse o país. Mas, após analisar o comportamento dos envolvidos, o promotor de Justiça de Zurique, Marcel Frei, decidiu reter o passaporte da brasileira. "O passaporte está comigo", disse o promotor. Frei quer colher pelo menos um depoimento da brasileira antes de liberá-la. A confissão à polícia terá de ser repetida à Justiça para que seja considerada no processo penal.

"Vamos pedir um depoimento dela para saber exatamente o que ocorreu", afirmou Frei. "A acusação é de falso testemunho e, por enquanto, ela não pode sair. Mas isso pode mudar. Na minha avaliação, ela poderá deixar a Suíça em algum momento. Mas ainda é cedo para dizer", explicou. "A lei diz que ela pode ficar até 3 anos presa, ou pagar uma multa. Essa multa pode ser de alguns milhares de francos suíços", disse o promotor.

"Cabe à Justiça provar que ela é culpada. Até que se prove o contrário, ela é inocente. Ela não está presa", afirmou o advogado Roger Muller. Ele diz que tentará convencer a Justiça local para que Paula possa acompanhar o caso do Brasil. "Se ela retornar ao Brasil, eu serei seu representante legal aqui", disse. O advogado não quis responder se tentaria justificar a fraude alegando que ela sofre de problemas psiquiátricos.

Ontem, Paula permaneceu todo o dia trancada em sua casa, com todas as janelas fechadas e sem atender ninguém. O local foi visitado pela imprensa suíça e por curiosos. A única pessoa que entrou foi um amigo do noivo de Paula, que tirou do apartamento o computador pessoal do suíço com seus e-mails.

O Itamaraty decidiu reforçar o consulado do Brasil em Zurique, enviando um diplomata de Brasília para cuidar exclusivamente do caso. A pacata cidade de Dubendorf transformou-se em notícia em todo o país. Os vizinhos de Paula admitiam que estavam surpresos com a história. O brasileiro Warlei Alves alerta que já foi alvo de um ataque de neonazistas na região onde Paula vive, três anos atrás. "Recebi socos e me ofenderam por ser estrangeiro", afirmou o brasileiro, de 19 anos.

Ele conta que não apresentou denúncia, mas seus amigos confirmam a história. "Esses ataques ocorrem mesmo e, quando ouvi a história, pensei que era mais uma delas", afirmou. Ontem, um carro com dois skinheads rodeou a casa de Paula, para a surpresa dos que estavam no local.

Mas, para brasileiros que vivem na vizinhança, a história é motivo de "vergonha" para a comunidade na Suíça. "Nossa imagem está queimada", disse Eliana Baptista, uma das 40 mil brasileiras que vive na parte de língua alemã da Suíça. Outra brasileira, que pediu para não se identificar, afirma que já sentiu uma diferença no tratamento de autoridades suíças em relação aos brasileiros.

Para alguns suíços, a decisão da Justiça já foi uma espécie de vingança contra as declarações de autoridades brasileiras que se apressaram em declarar o caso como um incidente de xenofobia.