Título: O Banco Central e a gasolina
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/03/2009, Economia, p. B2

Em fevereiro, o Banco Central (BC) culpou os bancos por cobrarem juros excessivos na ponta do crédito.

Desta vez, parece ter-se esquecido do spread (diferença entre os juros que os bancos pagam e os que cobram) e advertiu, na Ata do Copom divulgada quinta-feira, que os juros não caem mais porque certos efeitos inflacionários "subsistem no arcabouço institucional do sistema financeiro nacional" (parágrafo 25).

Alguns diretores do BC explicaram depois o que este texto sagrado quer dizer. E apontaram como obstáculo à queda da inflação e dos juros a indexação (correção monetária) e/ou os juros fixos que subsistem na caderneta de poupança, nas metas de desempenho dos fundos de pensão e em algumas tarifas, como as de energia elétrica e de telefonia.

Não foram estas as únicas vezes em que o BC denunciou entulhos monetários dos velhos tempos, que trabalham contra a eficácia da política de juros. Lá atrás, queixou-se também dos juros "subsidiados" da TJLP (praticados pelo BNDES), que acabam exigindo que o Copom reforce sua dose de juros básicos (Selic) para que possa haver o efeito desejado sobre os preços.

O spread e as tarifas bancárias não foram, desta vez, o único esquecimento do BC. Não disse que a inflação e os juros poderiam ser menores se a Petrobrás não praticasse preços políticos no mercado interno de combustíveis.

Os preços seriam hoje mais baixos (com impacto de pelo menos 0,5 ponto porcentual ao ano na inflação, no caso da gasolina) se prevalecessem internamente os do mercado internacional, de acordo com o analista Walter de Vitto, da consultoria Tendências. O último reajuste dos combustíveis ocorreu em maio de 2008, quando o preço do petróleo era de US$ 120. Sexta-feira, o diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, admitiu que os preços podem cair quando a Petrobrás zerar as perdas, seja lá o que isso signifique.

Como é proprietária de quase todos os reservatórios e dutos, a Petrobrás consegue manter o monopólio interno de derivados e, assim, evitar que outros importem combustíveis para revenda interna a preços mais baixos.

Os diretores da Petrobrás argumentam que nenhuma empresa está obrigada a trabalhar com preços internacionais e que qualquer agente econômico pode praticar a política que mais lhe convier. Argumentam, ainda, que, no momento, é preciso que os preços dos combustíveis continuem no atual nível de forma a compensar o prejuízo de cerca de R$ 17 bilhões que tiveram enquanto seguraram os preços abaixo dos praticados no mercado internacional, como sugere Paulo Costa.

Esse critério subjetivo e nada transparente não vale para outros preços da Petrobrás. No caso do querosene de aviação e do pagamento de royalties sobre a produção de petróleo, faz questão de praticar preços equivalentes aos internacionais. E, se houve prejuízo no passado, foi pela imposição de preços irreais no mercado interno e não porque tivesse adotado a política mais adequada.

Nesses temas, o BC trabalha com critérios ambíguos. Reclama do jogo contra produzido pelos preços administrados pelas telefônicas e pelas empresas de energia elétrica, mas não ousa reclamar dos preços políticos praticados pela Petrobrás.

Entenda

Um tantão assim - Pelos cálculos do analista Walter de Vitto, da Tendências, a gasolina vendida pelas refinarias da Petrobrás está 34,5% mais cara do que a do mercado americano.

A atual política de preços começou em maio de 2003. De lá até setembro de 2008, a Petrobrás mais perdeu do que ganhou. A partir de setembro, começou a ganhar.

Em algum momento entre março e junho deste ano, a Petrobrás terá recuperado tudo o que perdeu com a gasolina. Mas com o diesel a relação se inverte. "A Petrobrás é devedora porque praticou preços médios acima do mercado."