Título: Crise foi causada por gente branca, de olhos azuis, diz Lula
Autor: Marin, Denise Chrispim; Monteiro, Tânia
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2009, Economia, p. B9

Declaração foi destaque ontem no site do jornal inglês ?The Guardian?

Denise Chrispim Marin e Leonêncio Nossa, BRASÍLIA

Diante da delegação britânica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva despejou ontem a culpa pela crise financeira na irracionalidade de "gente branca e de olhos azuis". Os negros, os índios e os pobres, disse ele, são as maiores vítimas.

O raciocínio foi apresentado por Lula durante a entrevista coletiva que encerrou o seu encontro oficial com o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, no Palácio da Alvorada. "(Esta) é uma crise causada, fomentada, por comportamentos irracionais de gente branca, de olhos azuis, que antes da crise parecia que sabia tudo e que, agora, demonstra não saber nada", afirmou Lula, o atacar as medidas restritivas à imigração adotadas por países desenvolvidos, entre os quais está a Inglaterra.

Ao ser indagado por um jornalista britânico se essa lógica não exprime um preconceito ideológico, o presidente tentou emendar. Mas acabou reforçando sua tese. "Como eu não conheço nenhum banqueiro negro ou índio, eu só posso dizer que (não é possível) que essa parte da humanidade, que é a mais vítima do mundo, pague por uma crise."

O presidente do Merryll Lynch, um dos bancos americanos que teve de ser vendido por causa das perdas bilionárias com as hipotecas subprime, Stan O?Neil, é negro.

Dirigindo-se a Brown, Lula lembrou que a posse do presidente americano, Barack Obama, em janeiro passado, atraiu uma multidão de negros e de pobres inédita.

Ainda ontem a frase foi destaque no site do jornal inglês The Guardian, na matéria "Lula põe a culpa do crash nos banqueiros brancos". Impassível e econômico em palavras, Gordon Brown limitou-se a declarar que "não culparia indivíduos, particularmente" e calou-se sobre o assunto.

O escorregão do presidente, entretanto, não foi o único. Lula expressou-se com pouca familiaridade sobre questões que estarão em debate no encontro de cúpula do G-20, em Londres, no próximo dia 2. Lula claramente alegou não conhecer a proposta da China de criação de uma moeda global - tema que Brown confirmou que será debatido, de forma mais geral. Preferiu, em contrapartida, discorrer sobre o mecanismo de comércio Brasil-Argentina em moedas locais, que funciona parcialmente desde setembro passado. Ao apresentar sua opinião sobre o pacote de US$ 1 trilhão, anunciado pelo Tesouro americano e destinado à compra de "ativos tóxicos" de instituições financeiras do país, o presidente sugeriu que a medida seria um desperdício de dinheiro.

"Eu acho que a gente não pode ficar gastando o dinheiro que nos resta comprando títulos podres que, no mundo moderno, são chamados de títulos tóxicos", defendeu. "O que os EUA, que estão com problema no sistema financeiro, deveriam fazer é colocar esses títulos podres em um arquivo, transformá-los aos poucos em peças de museu", completou.