Título: Ação do MP movimenta Catanduva
Autor: Siqueira, Chico; Goraieb, Valéria
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2009, Metrópole, p. C3

Operação contra pedofilia fechou ruas e agitou bairros; mães de abusados dizem que ""Justiça começa a ser feita""

Chico Siqueira e Valéria Goraieb

A operação de caça aos pedófilos realizada ontem pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), de São José do Rio Preto, surpreendeu a população de Catanduva. Em todas as ações, grupos de curiosos, transeuntes e vizinhos das casas vasculhadas davam opiniões. No Jardim do Bosque, os agentes tiveram de pular o muro da casa do médico Wagner Rodrigo Brida Gonçalves para cumprir mandados de prisão e de busca e apreensão. "Nunca vi tanta movimentação neste bairro, mas acho que, se ele tem culpa, tem de ser preso", afirmou a moradora Terezinha Baracalle.

No bairro de classe alta moram personalidades de Catanduva, entre eles um dos maiores empresários da região, S.M., dono de uma indústria de ventiladores que emprega mais de 500 funcionários. A fachada da casa teria sido reconhecida por uma criança. Depois de duas horas vasculhando o local e os carros, promotores apreenderam um computador. "Não tenho o que esconder. Parece que a casa para onde as crianças eram levadas tem o mesmo tipo de muro da minha. Não tenho por que temer, mas ser acordado assim é ruim", afirmou M., enquanto cumprimentava, sem graça, os vizinhos.

Enquanto isso, na região central da cidade, a Rua Santa Catarina, uma das principais ligações com o centro, era fechada pela PM, para que promotores e agentes entrassem na casa da mãe de um empresário acusado de pertencer à rede. "A mãe dele está arrasada. Jamais esperava que o filho fosse se envolver nesse tipo de coisa", comentou a aposentada Maria René Pereira, vizinha do imóvel. O cumprimento do mandado de busca e apreensão só terminou depois das 14 horas, quando os agentes saíram com um computador nas mãos.

A poucos metros, o gerente Mildo César José, morador na região há 30 anos, não se conformava com a prisão do comerciante André Luís Canto Centurion, em São Paulo. "Jogava bola com ele e sei que ele não é culpado." Centurion é filho de um comerciante tradicional da cidade, dono de uma casa de tintas.

No Jardim Alpino, na periferia, onde moram as 40 crianças que fizeram as denúncias, os promotores foram até uma chácara onde elas teriam sido abusadas. Eles estavam à procura de materiais de pornografia infantil e provas. Lá encontraram 25 máquinas caça-níquel. Na casa de dois adolescentes, que foram presos há 15 dias sob acusação de levar as crianças para as sessões de abuso, foram apreendidos CDs com filmes pornográficos e fotos de nus infantis.

JUSTIÇA

As mães das crianças abusadas disseram ver "com alívio" a ação dos promotores. "Glória a Deus, que a justiça começa a ser feita", desabafou a diarista Roseli Cristina Prudêncio, de 30 anos, uma das primeiras a denunciar os abusos. "Agora sim dá para perceber que foi bom a gente ter perdido o medo e mostrado a cara", disse Roseli, mãe de um menino de 11 anos e de uma menina de 8 anos. Ambos acusam o borracheiro José Barra Nova de Mello de abuso. "Esses pedófilos têm de ser condenados", afirmou ela.

Para a cozinheira Elaine Lopes, de 33 anos, "a blitz do MP serviu para mostrar que o borracheiro não agia sozinho". Quando surgiram as primeiras denúncias, há dois meses, a Justiça decretou a prisão do borracheiro de bicicleta José Barra Nova Melo, de 49 anos, conhecido como o Zé da Pipa. "Quando fizemos a denúncia, muitas pessoas disseram que estávamos exagerando", disse. Segundo ela, a operação trouxe "alívio". "Somente ficaremos satisfeitas quando virmos esses monstros atrás das grades", disse Elaine, que teve três filhos - dois meninos, de 11 e 14 anos, e uma menina, de 13 - abusados.

A extensão da rede de pedofilia, que incluiria abusos a 40 crianças, ainda levanta dúvidas no Ministério Público Estadual. Os promotores do Gaeco acreditam que são dados "exagerados". "A disseminação dos envolvidos em âmbito internacional é ficção", assegurou o promotor João Santa Terra Junior, de Rio Preto. Ele ressaltou, porém, que as prisões temporárias eram necessárias para assegurar que eventuais suspeitos sejam impedidos de interferir nas investigações.