Título: Relatora é contra pneu usado da UE
Autor: Gallucci, Mariângela
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/03/2009, Vida&, p. A20

Ministra do STF vota por fim da importação do produto europeu usado, mas abre exceção para compra do Uruguai

Mariângela Gallucci

O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá concluir que as normas brasileiras que proíbem a importação de pneus usados e reformados da Europa são constitucionais. A decisão será tomada durante o julgamento de uma ação movida pelo governo, que começou a ser julgada ontem pelo plenário do tribunal.

Mas um pedido de vista do ministro Eros Grau interrompeu o julgamento depois que a relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, leu seu voto favorável à proibição por entender que a Constituição Federal estabelece que o Estado deve proteger a saúde da população e garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Não há previsão de quando o julgamento será retomado.

"É extremamente curioso o argumento das empresas em prol da importação dos pneus. Eu fico sempre achando que a cada dia aprendo mais, porque me impressiona a generosidade de países que, tendo problemas ambientais, com passivo de 3 bilhões de pneus, resolvem vender a preço de miséria para nossos tristes trópicos, exatamente algo que é tão bom, tanto para gerar empregos quanto para melhorar as condições ambientais", afirmou a ministra no julgamento.

"A autorização para importação de pneus usados é geradora de mais danos do que benefícios", disse a ministra. Segundo Cármen Lúcia, todo pneu se transformará em algum momento em um produto danoso à saúde e ao ambiente. "Todos os últimos quatro presidentes da República em cinco mandatos consecutivos estabeleceram políticas públicas no sentido de impedir a importação de pneus usados", defendeu o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli.

Durante o julgamento, ela lembrou que os pneus podem servir de abrigo para insetos que transmitem doenças graves como dengue, malária e febre amarela. A ministra afirmou que o Estado não pode se omitir em relação à saúde. "A Constituição brasileira, como todas as que vigoram democraticamente hoje, não confere direitos fundamentais mediante fatura a ser paga com vidas humanas", afirmou.

Cármen Lúcia reconheceu a validade da exceção feita à importação de pneus já reformados de países do Mercosul, principalmente do Uruguai. Essa importação não chegou a ser questionada pelo governo no STF. Segundo o advogado-geral da União, que defendeu a posição do governo no julgamento, em média são importados do Mercosul cerca de 130 mil pneus reformados por ano, o que, conforme ele, é uma quantia muito pequena em comparação aos 10 milhões de pneus importados da Europa em 2005. Além disso, o Mercosul é o bloco comercial do qual faz parte o Brasil.

Mas foi essa exceção que levou a Organização Mundial do Comércio (OMC) a condenar o Brasil, em dezembro de 2007, por adotar medidas discriminatórias. A OMC concluiu que o governo teria duas opções - ou implementar completamente o embargo e fechar seu mercado ou não praticar discriminações e importar da Europa.

ENTENDA O CASO

Desde 1991, o governo editou normas para proibir a importação de pneus usados, com exceção dos vindos do Mercosul. Em dezembro de 2007, a Organização Mundial do Comércio determinou que o País teria de banir a entrada dos produtos, além de acabar com as liminares concedidas a certos importadores. No mês seguinte, o Brasil acatou a decisão

Em novembro do ano passado, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, encaminhou um parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) recomendando a suspensão das decisões judiciais que permitem a importação de pneus usados. Entretanto, o País não conseguiu fazê-lo no prazo de 11 meses estabelecido pela OMC, que se esgotou em 17 de dezembro de 2008

Com isso, o Brasil ficou sujeito a retaliações da União Europeia. O governo brasileiro avaliou que seria mais benéfico arcar com a retaliação europeia do que abolir a proibição ou alimentar tensão com sócios do Mercosul