Título: Empresários terão de negociar com a Argentina
Autor: Marin, Denise Chrispim; Veríssimo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/03/2009, Economia, p. B4

Itamaraty quer que empresários negociem acordos comerciais

Denise Chrispim Marin e Renata Veríssimo

O Itamaraty vai jogar para o empresariado brasileiro a incumbência de negociar com os seus concorrentes argentinos acordos setoriais de redução voluntária dos embarques de produtos nacionais para o país vizinho. A proposta será sugerida hoje pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), como meio de enfrentar o aparato protecionista montado pela Argentina desde setembro do ano passado.

A proposta responde à iniciativa do Palácio do Planalto de desarmar os setores do governo que defendem a adoção de represálias comerciais contra barreiras impostas à Argentina - os ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e da Agricultura.

Como em 2004, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva preferiu uma solução política e uma boa dose de boa vontade dos industriais brasileiros para dissolver o atual conflito comercial com a Argentina.

A Fiesp, que há um mês argumentava que diálogo "não resolve nada" e exigia do governo a imposição de barreiras a produtos argentinos, deverá assumir a empreitada sugerida pelo chanceler.

Fontes da entidade informaram que o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, está disposto a sintonizar o discurso dele com o do ministro Amorim. Até o encontro entre o presidente Lula e a presidente argentina, Cristina Kirchner, na sede da federação, no próximo dia 20, não interessa a Skaf que apareçam novos focos de conflito no comércio bilateral.

"É melhor isso (acordo setorial) que medida antidumping. Não que sejamos a favor dessa solução, mas podemos aceitá-la, eventualmente, como um mal menor", afirmou o diretor do Departamento de Comércio Exterior e Relações Internacionais, Roberto Giannetti da Fonseca. "A situação com a Argentina está, realmente, muito feia".

IGUAL A 2004

A proposta de estimular os acordos setoriais deverá ser levantada pela delegação brasileira no próximo dia 12, em Buenos Aires, durante a primeira reunião do grupo de trabalho que trata do atual conflito bilateral. Esse mecanismo seguiria os moldes do adotado entre 2004 e 2006 para os setores eletrodomésticos, de calçados e de têxteis. Os mesmos fabricantes argentinos seriam favorecidos.

Os acordos desse gênero envolvem compromissos de redução voluntária de embarques por parte da indústria brasileira, firmados sob a tutela de ambos os governos. Em contrapartida, a Argentina deverá assumir a promessa de adotar medidas de estímulo à produção da indústria local, para que seja capaz de suprir parcela do consumo interno antes coberto por produtos brasileiros, e de evitar a ocupação desse mercado por fornecedores de outros países, sobretudo os asiáticos. Como no passado, esses acertos serão temporários.

A proposta não chega a atender a máxima reivindicação da ministra de Produção argentina, Débora Giorgi, de adoção de comércio administrado - opção repudiada pelo Brasil. Mas o Itamaraty avalia que há grandes chances de a Argentina agarrar essa ideia, uma vez que vários setores argentinos pediram a negociação de acordos como esses nos últimos três anos - todos rejeitados pela indústria nacional.

A proposta vai se somar ao pacote de bondades na área financeira oferecido pelo Brasil à Argentina no último dia 17, em Brasília. O principal ponto é a criação de um modelo de swap de moedas, por meio do qual o Banco Central do Brasil poderia injetar reais na Argentina, que os devolveria em moedas nacionais.

Os recursos seriam direcionados a companhias argentinas em dificuldade para financiar suas exportações.