Título: Engenheiro segue rio voador
Autor: Gonçalves, Alexandre
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/03/2009, Vida&, p. A20

Por 2 anos, pesquisador fez viagens em avião para investigar itinerário da água evaporada na Amazônia

Alexandre Gonçalves

O projeto Rios Voadores divulgou ontem as primeiras análises dos dados coletados pelo engenheiro Gérard Moss. Durante dois anos, ele realizou 12 viagens com um avião monomotor para investigar os itinerários da água evaporada na Amazônia - os "rios voadores" que dão nome à pesquisa. O estudo preliminar confirma o impacto da floresta no regime de chuvas das Regiões Sudeste e Sul.

Foram coletadas cerca de 500 amostras de vapor de água em diferentes altitudes. "É uma ótima base de dados para aperfeiçoar nossos modelos", afirma Pedro Dias, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP.

Durante a apresentação, Moss descreveu a viagem realizada entre 4 e 11 de fevereiro do ano passado. Na ocasião, ele acompanhou um "rio voador" que percorreu a Amazônia e, depois de esbarrar na Cordilheira dos Andes, chegou a São Paulo. A quantidade de água transportada foi estimada em 3.200 m³ por segundo no último dia da viagem, um fluxo 27 vezes maior do que o volume transportado pelo Rio Tietê. A vazão naquele dia do rio atmosférico correspondeu ao consumo de água na cidade de São Paulo durante 115 dias.

Moss esclarece que nem toda a água que sai da Amazônia transforma-se em chuva no sul do continente. "Ela está disponível para cair como chuva", afirma o explorador. "Mas há outras variáveis importantes que determinam se isso vai acontecer realmente." Também recorda que fluxos oriundos de outras regiões - especialmente do Atlântico - exercem um papel fundamental no regime de chuvas.

Para realizar o estudo, Moss contou com a ajuda de cientistas de diversas instituições de pesquisa do País e R$ 2,5 milhões da Petrobrás. O dinheiro serviu também para construir um equipamento que, acoplado ao monomotor, coletava amostras das nuvens e as condensava em pequenas gotas de água.

O líquido era analisado no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), em Piracicaba (SP). Determinados isótopos de hidrogênio e oxigênio presentes nas moléculas de água serviam como "assinatura" do percurso realizado pelo vapor de água, comprovando sua origem na Amazônia.

Dias afirma que ainda é difícil prever os efeitos do desmatamento no regime de chuvas, mas eles podem incluir tanto secas quanto enchentes em outros Estados.