Título: TRF tira da pauta julgamento de processo contra De Sanctis
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/04/2009, Nacional, p. A13

É a segunda vez que corte adia sessão para analisar caso do juiz que mandou prender Dantas

Fausto Macedo

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF 3) adiou inesperadamente a sessão do Órgão Especial para analisar expedientes da corregedoria que podem originar a abertura de procedimentos administrativos contra Fausto Martin De Sanctis, o juiz da Operação Satiagraha - investigação sobre suposto esquema de evasão de divisas e lavagem de dinheiro que envolve o banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity.

A decisão sobre a transferência do julgamento foi informada na noite de segunda-feira ao advogado Pierpaolo Bottini, defensor do magistrado. A audiência estava marcada para hoje, mas foi excluída da pauta. Ficou para o dia 30, se não houver nova alteração na data.

É a segunda vez que a corte adia a sessão, sem apresentar motivos. A indefinição agrava ainda mais o cenário de tensão no TRF 3, maior tribunal regional do País, com jurisdição em São Paulo e Mato Grosso do Sul, marcado pelo embate em torno da eleição para presidência da corte.

Há duas semanas, o desembargador Paulo Octávio Baptista Pereira foi escolhido por seus pares para dirigir o TRF 3 nos próximos dois anos, mas sua oponente, desembargadora Suzana Camargo, que perdeu o pleito por 21 votos a 17, entrou com reclamação no Supremo Tribunal Federal requerendo anulação da eleição e sua posse automática no posto.

A assessoria da desembargadora Marli Ferreira, atual presidente do TRF, assegurou que "não há nada de excepcional" na mudança de data do julgamento sobre De Sanctis. Esclareceu que o Órgão Especial é composto pelos 18 desembargadores mais antigos e alegou que reunir o grupo inteiro muitas vezes implica tarefa complexa.

DIVISÃO

Se abrir os processos administrativos contra De Sanctis, o Órgão Especial também vai deliberar sobre eventual afastamento de suas funções de titular da 6ª Vara Criminal Federal, cargo que ocupa há 11 anos. A hipótese de desligamento do juiz é remota, avaliam magistrados federais - para eles o impacto de uma ordem dessa natureza poderá envolver a corte em polêmica sem precedentes.

A corte está dividida sobre o futuro do juiz. Um grupo o defende, ainda que reservadamente, mas outros veem oportunidade para afagar o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal. Desde o estouro da Satiagraha, o juiz e o ministro travam nervoso duelo de bastidores.

O julgamento no TRF põe em discussão a atuação de De Sanctis, que sofre críticas ostensivas de advogados criminalistas - defensores dos réus do juiz - e de ministros do STF, mas tem o apoio declarado de procuradores da República e de sua própria classe.

São dois os procedimentos que a corregedoria poderá propor contra De Sanctis. O primeiro trata de suposta desobediência do magistrado a ordem do STF no caso MSI/Corinthians - ele é acusado de ter dado andamento ao processo contra o empresário russo Boris Berezovski, por evasão de divisas, contrariando decisão do ministro Celso de Mello, que havia ordenado liminarmente a suspensão de todos os atos processuais no caso.

O segundo procedimento refere-se à polêmica com Gilmar Mendes. No auge da Satiagraha, em 2008, De Sanctis decretou a prisão temporária do dono do Opportunity. Mendes mandou soltar Daniel Dantas, em liminar, mas em seguida o juiz da 6ª Vara ordenou a prisão preventiva do alvo maior da operação, por corrupção ativa.

Ontem, a Associação dos Juízes Federais em São Paulo reiterou solidariedade a De Sanctis. Em nota, argumenta que "confia no senso de justiça e na independência" dos integrantes do Órgão Especial. "Os atos tomados por um juiz no exercício da função jurisdicional não são passíveis de medidas disciplinares, sendo esse um dos pilares da independência judicial e da ordem democrática", assinala o texto, subscrito pelo presidente da entidade, Ricardo de Castro Nascimento.