Título: Com crise e desonerações, Receita arrecada R$ 11,33 bilhões a menos
Autor: Fernandes, Adriana; Veríssimo, Renata
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/04/2009, Economia, p. B1

Resultado do trimestre é negativo pela primeira vez, desde 2003, e corresponde a queda real de 6,6%

Adriana Fernandes e Renata Veríssimo

A crise econômica derrubou em R$ 11,33 bilhões a arrecadação da Receita Federal no primeiro trimestre deste ano em comparação ao mesmo período do ano passado. Uma parte dessa queda - R$ 3,1 bilhões - foi provocada pelas desonerações praticadas pelo governo para combater os efeitos da crise financeira e estimular a retomada do crescimento econômico.

A Receita calcula em R$ 6,5 bilhões o impacto no trimestre do total da redução de impostos adotado para vários setores ao longo de 2008 e início de 2009. Esse valor reflete, também, o efeito dominó da desaceleração da produção industrial e da redução do lucro das empresas no pagamento dos impostos.

A arrecadação fechou o primeiro trimestre em R$ 159,8 bilhões, com uma queda real (acima da inflação) de 6,6%, segundo dados divulgados ontem pela Receita. Foi a primeira vez, desde 2003, que o resultado do trimestre é negativo. Em valores corrigidos pela inflação, a arrecadação no ano foi de R$ 160,36 bilhões ante R$ 171,69 bilhões no primeiro trimestre de 2008.

Em março, a arrecadação somou R$ 53,26 bilhões, uma retração de 1,11% sobre março do ano passado. Foi o quinto mês consecutivo de queda. O valor arrecadado no mês passado, no entanto, foi avaliado como um sinal de desaceleração do ritmo de queda da arrecadação, que começou em novembro do ano passado com o agravamento da crise financeira. Em fevereiro, o pior mês desde a fase mais aguda da crise, a queda foi de 11,53% em comparação a igual mês do ano passado.

A melhor performance em março, que garantiu uma expansão real de 17,84% da arrecadação em relação a fevereiro, é atribuída pela Receita ao pagamento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Os dados foram considerados animadores porque os impostos pagos em março refletem o desempenho econômico de fevereiro. Por isso, o boom de vendas no setor automobilístico no mês passado está sendo esperado com grande expectativa. A aposta é que, em abril, o resultado da arrecadação será melhor.

A redução das alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos novos, até junho, teve forte impacto na arrecadação: provocou uma queda no recolhimento desse tributo em março, de 90,92%. No trimestre, a perda foi de R$ 1,3 bilhão. O governo espera que o benefício retorne aos cofres públicos por meio da arrecadação dos impostos que incidem sobre o faturamento das empresas. "Estamos num contexto de política econômica anticíclica. E, nesse contexto, nós desoneramos para, mais à frente, termos os efeitos sobre a economia", argumentou o coordenador geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita, Marcelo Lettieri. Ele disse que, em março, a melhor arrecadação foi puxada pelo desempenho das receitas previdenciárias - alta de 17,12% - garantida pelo aumento do salário mínimo concedido em fevereiro, além do aumento de 16% da massa salarial em fevereiro.

A Receita afirma que neste mês já é possível observar uma melhoria no pagamento de impostos. Mas reconhece que não se pode falar em tendência. O maior problema é que o crescimento da arrecadação do IRPJ e da CSLL está relacionado ao recolhimento da declaração de ajuste anual, o que não se repetirá nos meses seguintes. A arrecadação desses dois tributos decorrente do ajuste anual foi de R$ 5,8 bilhões. As empresas que declaram o imposto pelo lucro e pagam o tributo mensalmente por estimativa têm de fazer esse ajuste até março de cada ano.

No ano passado, as empresas optaram em antecipar o pagamento do ajuste anual nos meses de janeiro e fevereiro para evitar a correção da taxa Selic que incide sobre o tributo. Na época, as empresas estavam capitalizadas com os lucros do ano anterior e a taxa Selic estava em tendência de alta.

Agora, o cenário mudou: menos dinheiro em caixa e juros em queda. Por isso, segundo Lettieri, a opção das empresas pela declaração de ajuste no mês passado. Apesar da expectativa de recuperação da arrecadação, em função da retomada da economia, o impacto das desonerações ainda será percebido nos próximos meses. A estimativa da Receita é que as desonerações em 2009 somarão R$ 20,3 bilhões, sem considerar as novas reduções que serão autorizadas pelo governo.