Título: Superávit é o menor desde 2004
Autor: Graner, Fabio; Nakagawa, Fernando
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/05/2009, Economia, p. B3

Parte do resultado se deve ao aumento dos gastos com juros, o maior registrado em um mês de março desde 1991

Fabio Graner e Fernando Nakagawa, BRASÍLIA

Em meio ao menor esforço fiscal do governo, os gastos do setor público com juros da dívida atingiram em março o maior valor para o mês da série histórica do Banco Central, iniciada em 1991. De acordo com os dados divulgados ontem, a despesa com os encargos da dívida atingiu R$ 14,10 bilhões no mês passado. Em fevereiro, essa conta registrou gasto de R$ 10,18 bilhões e em março de 2008, R$ 11,41 bilhões.

O gasto com juros no mês passado foi R$ 2,5 bilhões superior ao superávit primário - economia para o pagamento de juros - do período, que ficou em R$ 11,61 bilhões. Nos três meses iniciais de 2009, o esforço primário foi de R$ 20,91 bilhões, o equivalente a 3,01% do Produto Interno Bruto (PIB) e o mais baixo para esse período desde 2004. O montante foi insuficiente para cobrir o gasto de R$ 38,72 bilhões (5,58% do PIB) com juros no trimestre.

CÂMBIO

O chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, disse que o impacto da valorização de 2,66% do real ante o dólar em março foi decisivo para o aumento da conta de juros. "Se não fosse o câmbio, o setor público teria uma despesa com juros menor", disse Altamir. Ele explicou que a apreciação cambial impacta as receitas de ativos dolarizados do governo e também diminui o valor total em reais desses direitos.

A redução de receitas com juros decorrentes da apreciação cambial, em março, foi de R$ 605 milhões, enquanto em fevereiro a desvalorização do real levou a um ganho adicional de receitas com juros de R$ 689 milhões. Essa inversão gerou uma piora de R$ 1,3 bilhão na conta de juros de fevereiro para março. Segundo ele, o gasto maior com juros no mês passado também foi influenciado pelo número maior de dias úteis.

MOVIMENTO PONTUAL

Para o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sérgio Vale, o movimento da conta de juros em março foi "pontual" e a tendência dessa despesa é de queda no curto e médio prazos.

"O que hoje está em 5,5% do PIB no acumulado em 12 meses deve começar a cair daqui a alguns meses e ficar entre 4,5% e 5% do PIB", disse Vale.

A economista da Rosenberg & Associados Fernanda Feil reconheceu que o gasto com juros em março foi acima do normal, mas minimizou o problema.

Segundo ela, essa despesa "continua controlada" e os efeitos da redução da taxa Selic e da queda da inflação ainda serão notados no médio prazo. "Tudo isso vai ajudar na redução do pagamento de juros e isso vai permitir que a relação entre a dívida e o PIB volte a cair em 2010."

Em março, a dívida líquida do setor público, sobretudo por conta do câmbio, subiu para 37,6% do PIB, ante 37,1% em fevereiro. A valorização do real adicionou R$ 10,36 bilhões ao estoque da dívida brasileira.

Apesar da salgada conta de juros, Altamir Lopes, do BC, destacou o resultado primário de março. Segundo ele, o esforço fiscal do governo foi "muito bom", considerando-se que ocorreu em um ambiente de forte queda na arrecadação, em função da perda de vigor da economia e das desonerações tributárias anunciadas pelo governo. "O mais importante é que esse resultado teve contribuição de todas as esferas de governo", afirmou Altamir.

ESTATAIS

Para a economista Fernanda Feil, o resultado foi bom sobretudo por conta da contribuição das estatais, o que tende a piorar com a retirada da Petrobrás do cálculo. "Mesmo com o resultado bom de março, as contas estão em franca deterioração. No trimestre, o superávit primário está em 3% do Produto Interno Bruto. Em igual período do ano passado, o esforço estava em 6,46%. Com a futura retirada da Petrobrás, a tendência é que piore mais", completou.

Embora não veja um iminente problema fiscal por conta do superávit primário menor, Sérgio Vale, da MB Associados, criticou a qualidade do gasto público. Em ano de queda de receitas, o governo não tirou o pé do acelerador do gasto com pessoal e custeio da máquina publica, enquanto os investimentos estão ainda em ritmo fraco, dada a necessidade gerada pela crise.

FRASES

Altamir Lopes Chefe do Departamento Econômico do BC

"Se não fosse o câmbio, o setor público teria uma despesa com juros menor"

Sérgio Vale Economista-chefe da consultoria MB Associados

"O que hoje está em 5,5% do PIB no acumulado em 12 meses deve começar a cair daqui a alguns meses e ficar entre 4,5% e 5% do PIB"