Título: O atendimento ao planejamento familiar
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/06/2009, Economia, p. B7

Antonio P. Mendonça

Os planos de saúde privados passam a ter de suportar os procedimentos necessários ao planejamento familiar. Desta vez em função de lei votada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República.

A ideia é boa e tem sentido. Então, como nossos congressistas pensam sempre no interesse do povo, desde que custeado com o dinheiro alheio, por que não votar uma lei determinando que os planos de saúde privados arquem com essas despesas? Rapidamente um deputado se encarregou da missão, sem encontrar maiores dificuldades para aprovar as novas regras, sem nenhum estudo para saber qual o impacto no custo dos planos, mas de acordo com o ritual do Congresso Nacional. E, depois, com a sanção presidencial.

Lei foi feita para ser cumprida. Não há muito que se possa fazer, exceto disponibilizar os procedimentos elencados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar para esse tipo de atendimento e, aí sim, fazer figa e rezar para o judiciário, por meio de liminares, não decidir ir além da lei, determinando o pagamento de procedimentos que a própria ANS diz que não devem ser cobertos.

Como sempre, a questão em discussão não é a oportunidade ou não da medida, nem se ela é justa. O que precisa ser visto é seu impacto no equilíbrio das contas das operadoras de planos de saúde privados. Quanto a inclusão desses novos procedimentos no rol de coberturas obrigatórias irá custar? E, na medida que, obviamente, devem ter um custo, como suportá-lo, já que não se falou em aumento de preço para manter o mútuo saudável.

Em artigo recente, mostrei como funcionam os aumentos dos planos de saúde privados e qual a situação desses produtos hoje, com o país em crise e o desemprego crescendo, principalmente nas regiões industriais, onde se concentra a maioria dos segurados.

Ao contrário do que vinha ocorrendo nos últimos anos, a situação econômica nacional é de retração. De acordo com estudos sérios, feitos por gente da mais competente, o País já estaria, aliás, em recessão técnica, por ter passado dois trimestres seguidos com crescimento negativo.

E, como mostrado naquele artigo, o desemprego consequente desse quadro afeta diretamente os planos de saúde privados. Em primeiro lugar, porque em breve haverá um faturamento menor e, em segundo, porque está havendo uma antecipação do uso dos planos para custear procedimentos que deveriam ser realizados ao longo de 2009.

Dinheiro não cai do céu, nem as operadoras de planos de saúde privados têm um pomar com árvores de notas de R$ 100, de onde podem colher cada vez que necessitam pagar uma despesa coberta.

O que precisa ser visto, antes da votação de lei como a que autoriza os procedimentos para o planejamento familiar, não é se ela é justa mas, sim, se o sistema de saúde privado consegue suportar o aumento de custos decorrente da inclusão dos novos procedimentos elencados por ela na relação de coberturas obrigatórias.

Quem custeia os planos de saúde privados são seus integrantes. Todo o dinheiro envolvido na atividade sai da contribuição mensal paga por cada segurado para bancar sua cobertura. Nesse valor estão incluídas as despesas com o atendimento à saúde, os custos comerciais e administrativos, os impostos e até eventual margem de lucro. Assim, é indispensável que haja o equilíbrio entre a capacidade de custeio da sociedade e as saídas para pagar os procedimentos cobertos. Se as saídas forem maiores do que as entradas, é apenas uma questão de tempo para a operadora quebrar.

Será que não é melhor um sistema mais flexível, que permita ao segurado escolher suas coberturas, do que a imposição pelo governo de atendimentos nem sempre suportáveis para a maioria da população? Atualmente, os planos privados atendem perto de 50 milhões de pessoas, mas contribuem com mais de 60% do total anual dos recursos para a saúde. Será que vale a pena colocar essa estrutura em risco e obrigar o SUS a atender todo mundo? Me parece que a maioria dos entrevistados responderia que não.

*Antonio Penteado Mendonça é advogado, sócio de Penteado Mendonça Advocacia, professor da FIA-FEA/USP e do PEC da Fundação Getúlio Vargas e comentarista da Rádio Eldorado.