Título: Para Itamaraty, embargo anacrônico deve cair agora
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/06/2009, Internacional, p. A21

Argumento semelhante, de que suspensão na OEA era resquício da Guerra Fria, funcionou em Honduras

João Domingos, BRASÍLIA

O governo brasileiro orientou o Itamaraty a trabalhar a partir de agora pelo fim do embargo econômico dos EUA a Cuba. As gestões diplomáticas serão feitas pelo chanceler Celso Amorim com a interlocução de dois personagens que o governo brasileiro considera fundamentais no processo: Thomas Shannon, o novo embaixador do EUA no Brasil, e Jorge Bolaños, chefe da sessão de Interesses de Havana em Washington, que foi o primeiro embaixador cubano no País depois que o governo Sarney (1985-1990) reatou relações com Cuba, em 1986.

Na avaliação brasileira, com a revogação pela Organização dos Estados Americanos (OEA) da resolução que expulsou Cuba da entidade em 1962, não há mais sentido em manter o embargo - uma estrutura da Guerra Fria. Mas, apesar das negociações, o fim das sanções depende também de decisão do Congresso dos EUA.

O Brasil vem conquistando um papel importante na reaproximação entre EUA e Cuba. Logo que Obama foi eleito, enviou um emissário para pedir ao governo brasileiro conselhos sobre as formas de reiniciar o diálogo com Havana. Foram sugeridos, pelo Brasil, como interlocutores, os nomes de Shannon, então subsecretário do Departamento de Estado para o Hemisfério Ocidental, e de Bolaños.

O argumento foi o de que as conversas teriam um caráter oficial, o que neutralizaria declarações contrárias à retomada do diálogo que viessem a ser dadas por aqueles interessados em sabotar a reaproximação dos dois lados.

O Itamaraty diz que já no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o Brasil vinha atuando nos bastidores para tirar Cuba do isolamento. Em 2000, depois de mais de uma década de crise por causa do fim da União Soviética, o governo de Fidel Castro fez algumas modificações no modelo econômico da ilha e permitiu que empresas de alguns países, entre eles o Brasil, formassem joint ventures em Cuba. Entre as brasileiras que passaram a atuar lá estava a montadora de carrocerias Busscar, de Santa Catarina.

No atual governo, Lula acertou em Cuba a renegociação de uma dívida com o Banco do Brasil, no valor de US$ 43 milhões. Abriu ainda um crédito de US$ 7 milhões no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a construção de uma usina de álcool. Em novembro, o Brasil inaugurou em Havana um escritório da Associação de Promoção das Exportações (Apex) e a Petrobrás assinou um acordo com a estatal cubana de petróleo para fazer prospecção em terra e em águas profundas.

Conforme as informações do Itamaraty, o fato de o Brasil já ter boa convivência com Cuba há 23 anos fez com que houvesse um imenso respeito dos cubanos pela forma como o País ajuda nas negociações.

No caso da revogação da resolução da OEA, o Brasil atuou nos bastidores tanto para ajudar a ilha quanto os EUA. Havia uma determinação dos governo da Venezuela, Equador e Bolívia de fazer discursos pesados na Assembleia-Geral da OEA contra os americanos por causa do embargo a Cuba. A delegação brasileira impediu que isso ocorresse.

Também havia uma forte resistência de Washington à uma volta de Cuba à OEA. Depois de muitas negociações, os brasileiros convenceram os americanos aceitarem a revogação do ato que suspendeu Cuba, lembrando-os de que um embate exporia uma derrota nos votos.