Título: Mercado teme que taxa de juro de 1 dígito dure pouco
Autor: Gobetti,Sérgio
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/06/2009, Economia, p. B5

Risco de mudança na atual política econômica, após as eleições de 2011, pode influir no rumo da Selic

Fábio Graner

Com mais uma redução da taxa Selic, na semana que vem, o Copom deve colocar os juros brasileiros numa nova taxa mínima histórica e na casa de um dígito. O novo nível da Selic, permitido e exigido pela crise financeira internacional, faz os economistas do governo e do setor privado perguntarem se esses juros vieram para ficar ou retornarão aos níveis de antes da crise.

No governo, apesar de algumas ressalvas, a resposta é sim. No mercado, há mais dúvidas, embora a maioria também concorde que a tendência é que o Brasil vai mesmo conviver com juros mais baixos.

"O Brasil tem plenas condições de permanecer com juros reais entre 5% e 6% ao ano. Hoje estão um pouco abaixo disso", disse uma fonte da equipe econômica, lembrando que antes da crise os juros estavam, em média, no nível de 7%. No entanto, o fato de a crise ter propiciado à economia brasileira um novo nível de taxa de juros não implica dizer que a Selic não voltará a subir. "Há uma chance grande de os juros terem que subir um pouco no fim de 2010, com a retomada da atividade econômica. Até por isso, o BC precisa aproveitar ao máximo o espaço que tem agora para cortar a Selic", avalia essa fonte, embora alguns assessores façam a ressalva de que, para os juros subirem, a economia terá de estar em um ritmo de crescimento extremamente forte.

Apesar de ser factível que a economia tenha alcançado um novo nível de juros, há um importante fator que deve ser considerado pelo seu potencial de influir no cenário macroeconômico: o risco político. Na avaliação de uma importante fonte do governo, uma mudança nos pilares da atual política econômica, a partir de 2011, poderia elevar as expectativas de inflação e também dos juros.

Essa fonte se refere explicitamente à estratégia de política econômica defendida pelo governador de São Paulo e provável candidato do PSDB à Presidência, José Serra. É atribuído ao governador a proposta de trabalhar com juros muito baixos e taxa de câmbio desvalorizada, política classificada de modo argentino.

"Se o Serra fizer o que está falando, o Brasil vai voltar a ter inflação elevada, o que vai provocar juros mais altos", disse. "Eliminado esse tipo de risco e considerando-se condições normais de temperatura e pressão, com a continuidade da política atual, dá para o País continuar com juros de um dígito", acrescentou o integrante da equipe quando lembrou que prevalece a tendência estrutural de redução na taxa de juros nos últimos anos.

Para o ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas, o novo nível de juros real tende a permanecer. "A não ser que se tenha um processo inflacionário forte nos Estados Unidos que leve o Fed (o BC americano) a subir juros, provocando uma forte fuga de capitais. Fora isso, não há justificativa técnica para os juros voltarem ao nível anterior. A mudança no nível de juros se deve à cada vez maior solvência do País."

O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, diz que há um componente conjuntural muito forte no atual nível de juros. Por isso, é de se esperar que, quando a economia brasileira retomar seu fôlego e crescer, os juros subam. Mas ele explica que essa subida tende a ser em intensidade menor do que nos apertos anteriores, o que revela que, de qualquer forma, o Brasil deve sair da crise com um nível menor de juros do que quando entrou. "O que temos visto nos últimos anos é que o pico de subida dos juros é cada vez menor. Gradualmente, a estrutura de juros vai para patamar mais razoável."

A economista-chefe do banco ING, Zeina Latif, avalia que qualquer palpite sobre se o Brasil alcançou um novo nível de juros é "achômetro".

"Estimar o que seria um juro de equilíbrio no Brasil é difícil, pois a economia teve muitas mudanças estruturais e, algumas vezes, a Selic subiu por conta de choques", afirmou Zeina. Ela tem a "percepção" de que o juro real está um pouco abaixo do equilíbrio. "Aparentemente, uma parte dessa queda é transitória, mas se a Selic voltar a subir, o movimento não deve ser muito forte."