Título: Petrobras tenta intimidar
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Fonte: O Estado de São Paulo, 10/06/2009, Notas & Informações, p. A3
Em razão do imbróglio em que se meteram os dois principais partidos da base governista - PT e PMDB -, disputando entre si os dois cargos de comando (presidência e relatoria) da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobrás, prestes a ser instalada, e com certeza duvidando da fidelidade de uns e outros, o presidente Lula acionou seu rolo compressor para forçar obediência às diretrizes "defensivas" do Planalto. Nisso praticou algo inédito nos regimes democráticos, pelo menos nos que seguem o princípio da independência e harmonia entre os Poderes de Estado, apregoado por Montesquieu: "convocou" o presidente do Congresso e os líderes dos partidos no Senado e passou a coordenar diretamente a montagem da CPI. Mas até isso foi pouco, se comparado ao desrespeito à opinião pública, cometido pela própria estatal, por meio de ameaça à liberdade de imprensa.
Em razão do noticiário sobre ingerências políticas, suspeitas em contratos e mecanismos de licitação, superfaturamento em contratações, favorecimento de ONGs ligadas a dirigentes e outros tipos de denúncias de irregularidades que levaram à criação da CPI no Senado para investigá-la, a Petrobrás criou o blog Fatos e Dados, no qual tem publicado listas de perguntas encaminhadas por jornais como o Estado, a Folha de S. Paulo e O Globo.
Assim, a estratégia montada pela Petrobrás, que tem a seu serviço um batalhão de 1.150 profissionais de comunicação - e ainda contrata empresas terceirizadas, sobre cujos contratos não presta informação alguma -, passa a ser a divulgação online das perguntas feitas por jornalistas - com as respectivas "respostas" da empresa -, antecipando, dessa forma, as informações que eram objeto de reportagens ainda em fase de elaboração. Com isso a direção da estatal encontrou um meio de tolher no nascedouro, de forma antiética, desleal, aleivosa, o bom jornalismo investigativo, que coleta informações das fontes e as checa, antes da devida publicação no órgão de imprensa. Com isso, a Petrobrás viola a tradicional relação entre fontes e jornalistas, de respeito pelas primeiras da pauta apresentada pelos profissionais de imprensa. O objetivo da Petrobrás é, claramente, "matar" as reportagens e banalizar o trabalho investigativo dos jornalistas.
A par dessa quebra desleal da relação da fonte com o jornalista e o veículo de comunicação social - que visando aos três maiores jornais atingiu a imprensa brasileira, como um todo -, o blog da Petrobrás também passou a tentar intimidar os veículos, ameaçando processá-los se não reproduzissem suas "respostas" da forma que a estatal considera correta. A Associação Nacional dos Jornais (ANJ), por seu vice-presidente responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão, Júlio César Mesquita, em boa hora repudiou, com veemência, a "atitude antiética e esquiva" manifestada pelo blog da estatal, que revela uma "canhestra tentativa de intimidar".
Atribuir esse procedimento - que tenta ceifar o jornalismo investigativo - à introdução de "transparência" na comunicação pública, como fez a direção da Petrobrás, não passa de deslavado cinismo. E sobre o "tratamento adequado" que a direção da empresa pretende que as notícias que saiam sobre ela obedeçam, coube à nota da ANJ a adequada resposta: "Tal advertência intimidatória, mais que um desrespeito aos profissionais de imprensa, configura uma violação do direito da sociedade a ser livremente informada, pois evidencia uma política de comunicação que visa a tutelar a opinião pública, negando-se ao democrático escrutínio de seus atos."
Desde que as oposições cogitaram de instalar uma CPI no Senado, para apurar as inúmeras denúncias de práticas irregulares na Petrobrás - e neste aspecto as oposições nada mais fazem do que cumprir seu papel -, o primeiro argumento intimidatório usado pelo Planalto foi o da necessidade de preservar-se a imagem da estatal. Investigá-la, chegaram a dizer, equivalia a um ato de lesa-pátria. Vindo à tona irregularidades, especialmente as mais graves, dúvidas poderiam pairar sobre a idoneidade da estatal do petróleo. Mas que imagem haverá de ter no mundo - e as notícias correm rápido na era globalizada - uma empresa que assume um papel tão antiético, na manipulação de informações de relevante interesse para a sociedade?